terça-feira, 29 de março de 2011

Justiça e Ética

Artigo de André Soares, publicado no Jornal do Brasil - 29/03/2011

Reza a constituição federal brasileira que dentre os objetivos fundamentais da república está à construção de uma sociedade justa. Esta é missão precipuamente protagonizada pelos poderes executivo, legislativo e judiciário, cujas decisões afetam o destino das pessoas, da sociedade e do próprio estado. Ressaltando que a democracia e a garantia do estado democrático de direito constituem cláusulas pétreas no Brasil, avulta o poder de nossos governantes, pela ingente legitimidade que possuem para determinar os rumos da vida nacional. Portanto, cabe à sociedade cobrar transparência e publicidade das ações dos três poderes, bem como a responsabilidade pelas decisões de seus integrantes, notadamente na aplicação da justiça. Habitualmente, esse debate limita-se quase exclusivamente à discussão de natureza estrutural sobre as deficiências institucionais existentes e a morosidade que aflige o judiciário, ferindo de morte o preceito constitucional da eficiência. Contudo, não se tem avançado na avaliação do mérito das decisões judiciais, quanto à consecução de sua destinação que é a promoção de uma justiça, que seja verdadeiramente justa.

Exemplos não faltam para justificar a relevância dessa temática, podendo nos valer das recentes e exatas palavras cuidadosamente proferidas pelo Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, em seu pronunciamento oficial sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), a respeito da denominada “lei da ficha limpa”: “...Se a pessoa não recorreu oportunamente, ela perdeu o prazo de recurso. Essa é uma questão processual. Agora, se é justo ou não é justo, isto é uma outra questão...”.
Depreende-se dessa justificativa, representativa das mais elevadas esferas da magistratura nacional, inúmeras reflexões inquietantes de natureza ética, sobre a égide axiológica que norteia suas decisões, como por exemplo: “Uma questão de ordem meramente processual deve prevalecer absoluta em detrimento do mérito de uma questão?” “A decisão judicial respaldada exclusivamente na legalidade é a garantia da promoção da justiça?” “A determinação sobre o que é justo pode ser aspecto secundário nas decisões judiciais?” “Decisões judiciais podem ferir a ética?”
Encontrar respostas éticas consistentes para esses e outros questionamentos, bem como aperfeiçoamentos efetivos nessa seara, é tarefa inglória que deságua nos diversionismos de nossos legisladores e nas ilações teórico-acadêmicas de nossos juristas.

A verdade é que, como já dizia o grande filósofo, “o estado se faz com boas armas e boas leis”, e infelizmente o Brasil não é um bom exemplo de nenhuma delas. Nossas forças armadas “não operacionais” são ineficientes em proporcionar a defesa nacional; pois são capazes de lutar, mas não de vencer. Nossos poderes da república contemplam o país com diplomas legais sem rigor jurídico, muitas vezes inconstitucionais, julgados em nossos tribunais à mercê de uma hermenêutica subjetiva; ora em favor de supostas boas intenções dos seus legisladores, ora dos seus julgadores.

O imbróglio da “lei da ficha limpa” é apenas mais uma infeliz conseqüência da imaturidade democrática brasileira, persistindo em querer fazer justiça exclusivamente pelo mérito de suas boas intenções. Essa é conduta temerária dos incautos, alardeada na sabedoria popular a admoestar-nos que “de bem intencionados, o inferno está cheio.”
O Brasil deve se libertar da política de decisões juridicamente adequadas a propósito de interesses governamentais e inaugurar uma justiça que seja verdadeiramente justa, de direito e de fato, que não se omita passivamente ante as injustiças do presente e do passado histórico, acessível aos brasileiros mais desfavorecidos e impiedosa na punição à corrupção dos mandatários, zelando exemplarmente pelas imposições de nossa carta magna. A consecução desse desafio está adstrita exclusivamente à esfera de atuação dos três poderes, não lhes faltando recursos de quaisquer naturezas, muito menos poder.

Portanto, a solução para a construção de uma sociedade justa demanda à sociedade dar investidura a governantes comprometidos intransigentemente com a ética. Porque uma justiça só é verdadeiramente justa se ética e promovida por pessoas éticas. Todavia, o digno apanágio da ética não está no notório saber jurídico, mas na coragem do caráter moral. Pois, lembremos que a construção da justiça é uma guerra permanente e letal, vencida somente pela coragem dos cidadãos éticos que se sacrificam por ela.


segunda-feira, 28 de março de 2011

INQUISIÇÃO, HEREGES E FOGUEIRAS


Gen Div R1 Clovis Purper Bandeira
1º Vice-Presidente do Clube Militar

O termo Inquisição refere-se a várias instituições dedicadas à supressão da heresia no seio da Igreja Católica. A Inquisição foi criada inicialmente para combater o sincretismo entre alguns grupos religiosos, que praticavam a adoração de plantas e animais.  A Inquisição medieval, da qual derivam todas as demais, foi fundada em 1184 no Languedoc (sul da França) para combater a heresia dos cátaros ou albigenses. Em 1249, implantou-se também no reino de Aragão, como a primeira Inquisição estatal e, já na Idade Moderna, com a união de Aragão e Castela, transformou-se na Inquisição Espanhola (1478 - 1821) – na qual celebrizou-se a figura do dominicano Torquemada, de triste lembrança – sob controle direto da monarquia hispânica, estendendo posteriormente sua atuação à América. A Inquisição Portuguesa foi criada em 1536 e existiu até 1821. A Inquisição Romana ou "Congregação da Sacra, Romana e Universal Inquisição do Santo Ofício" existiu entre 1542 e 1965.
O condenado era muitas vezes responsabilizado por uma "crise da fé", pestes, terremotos, doenças e miséria social, sendo entregue às autoridades do Estado, para que fosse punido. As penas variavam desde confisco de bens e perda de liberdade, até a pena de morte.
O delator que apontava o "herege" para a comunidade garantia, por seu ato,  sua e status perante a sociedade.
Ao contrário do que é comum pensar, o tribunal do Santo Ofício era uma entidade jurídica e não tinha forma de executar as penas. O resultado da inquisição feita a um réu era entregue ao poder secular.
A utilização de fogueiras como maneira de o braço secular aplicar a pena de morte aos condenados que lhes eram entregues pela Inquisição é o método mais famoso de aplicação da pena capital, embora existissem outros.
Séculos depois de terem sido encerrados os tribunais eclesiásticos do Santo Ofício e de terem cessado os autos de fé, o Brasil, mestre em recriar a história, estabelece seu Tribunal Inquisitório, sob o nome de Comissão Nacional da Verdade. Nela, os torquemadas tupiniquins julgarão os novos hereges, na maioria militares, que ousaram enfrentá-los e derrotá-los há algumas décadas.
Os delatores desses hereges, muitos já recebendo generosas pensões e indenizações por terem sido vítimas da “repressão” que impediu que transformassem, como era seu intento, o país em uma grande Cuba, garantem o reconhecimento governamental e sua pureza ideológica através da delação.  Já tendo recebido as gordas indenizações – isentas de imposto de renda – de que usufruem, receberão agora a doce vingança final de verem seus antigos adversários arrastados às barras deste tribunal de araque, composto majoritariamente por antigos esquerdistas e seus asseclas, que julgarão os agentes da lei e da ordem que, no cumprimento de seus deveres profissionais, ousaram combatê-los.  Assim, velhos criminosos, já premiados, vão completar a vendeta com a execração pública de seus pretensos algozes.
Conforme já decidiu o STF, não há crime a punir, visto que a Lei da Anistia eximiu todos os envolvidos, da esquerda e da direita.  No entanto, na visão caolha que perdoa guerrilheiros e terroristas e condena, apesar da Lei, os que contra eles lutaram, o linchamento público deve ocorrer, sob a desculpa de que os agentes do Estado têm responsabilidade, mas os bandidos e criminosos são vítimas inocentes, inimputáveis – e insaciáveis, como se vê.  São os únicos titulares dos “direitos humanos”.
Os defensores dessa absurda e tendenciosa Comissão alegam que apenas desejam descobrir o destino dos corpos de seus entes queridos, que desapareceram na luta contra a “ditadura”, embora quisessem implantar outra ditadura em seu lugar – só que, como eram e são donos da verdade, só eles podem julgar o que convinha e convém ao país.
É evidente que, para localizar cadáveres, a eficiência desses julgamentos é nula.  Mas isso é apenas desculpa, uma justificativa de apelo popular para encobrir as verdadeiras intenções vindicativas dos vencidos. Inverte-se o ditado romano: “Ai dos vencedores”.
Não tenho dúvidas de que nosso excelso Congresso aprovará a criação da Comissão desejada pelo Executivo, em troca da nomeação de mais alguns nepotes para cargos públicos a serem criados para abrigá-los.
As fogueiras estão sendo armadas.  Já se antecipa o cheiro de carne queimada.

O Brasil sem história


“O povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la” é reflexão muito conhecida que lamentavelmente se aplica perfeitamente ao Brasil, porque a sociedade brasileira desconhece significativa parcela da história contemporânea nacional dos últimos 60 anos. Como “a história é contada pelos vencedores”, evidentemente existem duas. A história oficial é a versão dos vitoriosos, doutrinariamente disseminada à sociedade, especialmente aos jovens. Porém, é a história verdadeira que os cidadãos deveriam se empenhar em conhecer. Contudo, pior que um país que não conhece a própria história é um país que a perdeu, e o Brasil é um infeliz exemplo dessas duas tragédias.  
As informações divulgadas sobre o período obscuro do país denominado “anos de chumbo” - ou seria “período da subversão?” - são originalmente tendenciosas e referem-se a um passado que existiu de fato, mas não de direito. Sobre ele, nosso país é incapaz de contar até mesmo a história oficial. Afinal, quem são os vencedores?
Quanto a isso, governos militares e civis nada fizeram, pois essa é uma verdade que os compromete indistintamente; tendo sido sepultada aos olhos da sociedade, cuja investigação sempre foi perigosamente proibida. Não por acaso, assistimos há décadas a total ineficiência dos poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, e do Ministério Público em abrir os “arquivos da ditadura”, blindados na “caixa-preta” dos serviços de inteligência nacionais, em flagrante e arrogante desrespeito ao texto constitucional e ao Estado democrático de direito vigentes. Somente o governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva mobilizou-se efetivamente pela busca das ossadas dos desaparecidos políticos.
O resultado de tudo isso? Nada de ossadas de desaparecidos políticos, nada de abertura de “arquivos da ditadura” e nada de história oficial. Quanto à história verdadeira, essa nem pensar! Apagar o passado é muito mais difícil que contá-lo e vivemos num estado constituído impotente em revelá-lo e prestar contas à sociedade, vencido que foi pelo medo daqueles que “desaconteceram” a história nacional, pelo muito que têm a esconder, a temer e a pagar, por crimes cometidos da maior gravidade. Portanto, a esperança da sociedade brasileira em conhecer a sua própria história não mais se tornará realidade, pois a verdade é que as ossadas dos desaparecidos políticos foram alvos de ações clandestinas cirúrgicas e tudo o que o país deveria saber sobre esse passado foi criminosamente e meticulosamente destruído.
Sem ossadas, sem arquivos, sem passado, mas subsiste a disputa fratricida das versões. Assim, a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República do governo Lula lançou o livro “Direito à memória e à verdade”. Em contrapartida, sentindo-se perigosamente ameaçados pela esquerda no poder, setores de uma direita pusilânime e sem rosto, tenta impor sua versão à sociedade, revelando do seu ostracismo um desacreditado dossiê de codinome “Orvil” (a palavra “livro”, ao contrário); outrora um dos mais secretos e poderosos instrumentos do arsenal de guerra política da cúpula desses serviços de inteligência.
Em 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou os efeitos da Lei de Anistia de 1979, esquivando-se da oportunidade jurídica de corrigir sua degenerescência em amnésia histórica e indústria extorsiva de indenizações contra o Estado; premiando assassinos, torturadores, seqüestradores e terroristas, com a impunidade.
Atualmente, a presidenta Dilma Rousseff, que vivenciou a realidade intestina desse nebuloso passado, enfrenta antagonismos em seu governo, protagonizados pelos comandantes militares  e a cúpula das Forças Armadas; indisfarçavelmente contrários à criação da “Comissão Nacional da Verdade”, destinada à investigação dos crimes ocorridos nesse período, temerosos que essa iniciativa esteja a propósito de obscuras retaliações.
A verdade é que o Brasil sem história já está revivendo seus próprios erros e caminha às cegas em sua ignorância incapaz de distinguir cidadãos de criminosos. Nossa história recente é um livro de páginas arrancadas, literalmente trituradas, incineradas e lançadas ao vento; que nossos legítimos governantes pretendem resgatar, conquanto tardiamente. Se nosso país perdeu definitivamente a sua história verdadeira, resta à inepta sociedade brasileira conformar-se com a construção de uma história oficial. Afinal, ao menos saberemos quem são os vencedores.

terça-feira, 8 de março de 2011

Mulheres na Inteligência

Artigo de André Soares, publicado no Jornal do Brasil e jornal Estado de Minas - 08/03/2011


As inúmeras referências históricas sobre a atividade de inteligência contemplam raros registros de destaque sobre a atuação feminina, conquanto normalmente coadjuvantes, demonstrando que a mulher tem exercido um papel quase inexpressivo, e sugerindo ser essa uma atividade mais vocacionada ao público masculino. Dentre os casos sobre a participação de mulheres na inteligência, citam-se como protagonistas mais conhecidas: Dalila, Raab, Nikita, Amy Thorpe, Mademoiselle Docteur, Condessa de Romañones, Edith Clavell, Odette, La Belle Boyd, Nancy Hart, Virginia Halle, Madeleine Khan, Elizabeth Schragmüller, Cristine Keller; sendo Margaretha Gertrud Zelle – a Mata Hari, a que provavelmente alcançou maior notoriedade e repercussão.

A história de Mata Hari é particularmente importante para a compreensão da relação da mulher com a inteligência, por representar emblematicamente o mito estereotipado da atuação feminina como ‘espiã-prostituta’, empregando o erotismo e a sedução sobre alvos do sexo masculino. Nesse sentido, surgem à reflexão questionamentos sobre o papel da mulher na inteligência, relativos à predominância dos homens nessa atividade, e à atuação feminina estar reduzida ao seu emprego como objeto sexual.

Esse estudo não tem despertado a atenção da sociedade brasileira, muito menos dos serviços de inteligência nacionais, nos quais tem sido considerada uma questão menor, inclusive irrelevante. Entretanto, trata-se de importante assunto pertinente à Inteligência de Estado, cuja desconsideração e desconhecimento têm causado prejuízos à melhor condução dessa atividade.

As conquistas das mulheres, particularmente no último século, representam uma vertiginosa superação das suas significativas dificuldades e diferenças político-sociais, existentes ao longo da história. Atualmente, elas têm alcançado expressiva participação em setores até então considerados exclusivos do sexo masculino, inclusive ocupando posições de liderança em várias áreas de atuação. Tais conquistas também são verificadas nos serviços de inteligência, especialmente dos países democráticos, embora ainda em menor proporção. Vale destacar que, no Brasil, fundamental contribuição para esse mister decorre da Constituição Federal de 1988 que impôs a obrigatoriedade do concurso para o ingresso no serviço público, proporcionando condições de igualdade de competição por mérito a todos os cidadãos. Isso vem acarretando a legítima e evidente projeção feminina em todo serviço público nacional, inclusive no seu serviço federal de inteligência - a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN). Nesse mister, vale ressaltar que a constatação da inequívoca excelência profissional do segmento feminino na ABIN vem, inclusive, invalidar tacitamente a tendenciosa argumentação defendida por certos setores da denominada ‘comunidade de inteligência’, contrária ao texto constitucional.

Destarte, à semelhança das demais áreas de atuação nas quais as mulheres vêm se destacando profissionalmente, o mesmo vem ocorrendo na Inteligência de Estado, notadamente em setores de análise, seara em que as mulheres se igualam e superam os homens. Porém, quando se trata da atuação feminina no segmento operacional, principal e mais sigiloso setor da atividade-fim da Inteligência, que realiza as ações sigilosas, a participação das mulheres praticamente inexiste no Brasil.

Se a Inteligência de Estado no país ainda é majoritariamente exercida por homens, o segmento operacional é quase completamente. Embora algumas mulheres já tenham alcançado os cargos de direção nos serviços de inteligência nacionais, essa realidade ainda não se estendeu ao segmento operacional, salvo raríssimas e históricas exceções. Esta questão torna-se ainda mais complexa diante da constatação de que a inexpressiva participação das mulheres nas operações de inteligência ocorre tanto por rejeição e discriminação contra elas, como também pelo êxodo do próprio segmento feminino.

Aqui se insere uma temática sensível, delicada e nebulosa, envolvida mais em erros e distorções do que em acertos. Cabe à sociedade, aos serviços de inteligência nacionais, e especialmente às mulheres, superar o desafio de investigar essa realidade, cuja importância é crucial para a Inteligência de Estado no país, na qual as mulheres descobrirão haver um ambiente profícuo de realização pessoal e profissional.

domingo, 6 de março de 2011

O destino da ABIN

Artigo de André Soares - publicado no Jornal do Brasil - 24/02/2011
Artigo de André Soares - publicado no jornal Estado de Minas - 15/02/2011
 
A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foi criada pela Lei 9.883, de 7 de dezembro de 1999, como órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin), para assessorar a Presidência da República produzindo informações de interesse do Estado, salvaguardando-o de ameaças à nossa sociedade e à soberania nacional. Contudo, a verdade inconveniente que nossos governantes não revelam, por temer retaliação da fúria da “comunidade de inteligência”, é a sua ineficiência generalizada. Isso decorre de sua perigosa instabilidade institucional, constituindo-se numa caixa-preta invencível e sem controle, que o Estado constituído – poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e Ministério Público – teme fiscalizar. O que ocorre na Abin? Ninguém sabe. Nem nossas autoridades e governantes, nem seus próprios dirigentes.
Todavia, o próprio Estado brasileiro predestinou a Abin a esses desígnios, pois uma instituição criada sob o corporativismo de uma comunidade obscura nasce desajustada. A Abin tem seus cargos de direção contaminados pelo nepotismo, exceção feita aos integrantes que nela ingressaram posteriormente, pela legitimidade da aprovação em concurso público, mas que são internamente preteridos e pejorativamente discriminados de “concursados”. Isso porque, em sua criação, a agência foi “aparelhada” com os grupos dessa comunidade, tornando-se reduto de grupos de ex-integrantes do Serviço Nacional de Informações (SNI); militares temporários da reserva do Exército desempregados e muitos “amigos dos amigos”, que se digladiam inescrupulosamente pelo poder. Obviamente que o resultado não poderia ser diferente dos sucessivos escândalos nacionais e internacionais que maculam sua atuação, cujo agravamento conduziu nosso país à maior e pior crise institucional de inteligência de sua história.
Em uma década de existência, a Abin conturbou os governos dos presidentes Fernando Henrique Cardoso, seu idealizador, e Luiz Inácio Lula da Silva, herdeiro desse explosivo legado, conquistando o infeliz recorde da exoneração de cinco diretores-gerais, todos envolvidos em sérias irregularidades, inexplicavelmente não apuradas.
Agora, a presidente Dilma Rousseff, com mais de um mês no poder, vive o recrudescimento desse grave problema, deparando-se com a recorrente questão: o que fazer com a Abin? O receio deste ensejo desencadeou recentemente uma avassaladora ação de seus “arapongas”, pressionando a Presidência da República e a sociedade, tomando como pretexto uma pseudorrepresentatividade nacional de suas associações, ferindo de morte os princípios da hierarquia, disciplina, e do sigilo institucional, sempre convenientemente evocado para encobrir a publicidade de suas ações. Todavia, essa é apenas uma inexpressiva parcela da guerra clandestinamente travada pela autofágica comunidade de inteligência, que alcança diversas instâncias do poder público.
Vale dizer que a Abin foi criada originalmente subordinada ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI/PR), sucedâneo da antiga Casa Militar, o qual é chefiado exclusivamente pelos generais da cúpula do Exército, principal protagonista da criação do Serviço Nacional de Informação (SNI), em 1967, no então regime militar. Lembremos que, não por acaso, o grande mentor da criação da Abin foi o general Alberto Mendes Cardoso, que foi também o primeiro chefe do GSI, legitimando a influência militar na atividade de inteligência. Porém, atribuir à subordinação da Abin ao GSI a causa da crise nacional de inteligência é desconhecer completamente essa problemática. A presidente Dilma Rousseff, em especial, compreende os riscos potenciais que essa conjuntura representa para a segurança nacional, pois o Brasil sequer tem uma política nacional de inteligência.
Ao que na verdade estamos assistindo são as manifestações explícitas de uma metástase institucional, por sua degenerescência aquiescida em mais de 11 anos de inépcia e diletantismo irresponsável de nossas autoridades. Se este é um problema afeto à inteligência de Estado, sua solução é exclusivamente de ordem moral, pois demanda de nossos dirigentes ter a coragem de enfrentá-lo, atitude que os antecessores da presidente Dilma Rousseff não tiveram. A sociedade brasileira vive a expectativa histórica e a esperança de que ela tenha esse mérito. Porque o destino de histórias dessa natureza já é conhecido de sobejo pela sabedoria popular que professa: “Do pau que nasce torto, até a cinza é torta”.

Segurança Institucional

Segurança Institucional
Palestra de André Soares no 1o Congresso Brasileiro de Gestão do Ministério Público - Governança institucional”, patrocinado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Segurança Institucional é um tema ausente da agenda nacional e tradicionalmente não constitui prioridade das autoridades e dirigentes do poder público. Habitualmente, essa temática ganha evidência quando da ocorrência de contingências de grande proporção, cujos danos e prejuízos ao país expõem deficiências e revelam sérias vulnerabilidades institucionais, ensejando inclusive a devida responsabilização criminal dos envolvidos. Infelizmente, prevalece em nossa sociedade a subcultura em que os paliativos imperam em detrimento das soluções, potencializando o agravamento do risco à segurança. Nesse mister, a importância da segurança institucional transcende a ação de proteção e salvaguarda, pois afeta diretamente a eficiência de nossas instituições e, em última instância, a própria segurança nacional.
Exemplos lamentáveis não faltam para ilustrar essa realidade no Brasil, como o afundamento, em 2001, na bacia de Campos, da plataforma da Petrobras P-36, maior plataforma marítima de exploração de petróleo do mundo, implicando um prejuízo de US$ 354 milhões e a morte de 11 funcionários. O relatório da Agência Nacional do Petróleo (ANP) apontou uma série de irregularidades que teriam levado ao acidente, como problemas mecânicos, falta de treinamento, uso indevido de equipamentos, falta de sistema de controle, deficiências no projeto e erros no gerenciamento da P-36.     
(Plataforma da Petrobras P-36)
Outro trágico exemplo, ocorrido em 2003, foi a explosão que destruiu o foguete brasileiro VLS-1, no Centro de Lançamento de Alcântara/MA, que além dos ingentes prejuízos financeiros não divulgados e do sério comprometimento do estratégico projeto aeroespacial brasileiro, matou 21 técnicos civis. Os relatórios dos ministérios da Defesa, e da Ciência e Tecnologia apresentaram como causas uma série de erros de segurança e manutenção na base.
 
(Explosão do foguete brasileiro VLS-1, no Centro de Lançamento de Alcântara/MA)
(21 técnicos civis falecidos na explosão do foguete brasileiro VLS-1)
Vale dizer que, em ambos os casos, a despeito das inúmeras irregularidades, falhas de segurança e comprometimento à soberania nacional, estranhamente não foram apontados culpados.
Não nos esqueçamos do maior caso de corrupção da nossa república, que ganhou notoriedade em 2005 como o “escândalo do mensalão”. Lembremos que o ensejo de sua descoberta originou-se da corrupção interna dos Correios, desvelada em filmagem clandestina, na qual o chefe do Departamento de Contratação e Administração de Material daquela instituição recebia propina para fraudar processo licitatório daquele órgão.
 (Maurício Marinho, chefe do Departamento de Contratação e Administração de Material dos Correios, é filmado negociando propina com empresários, interessados em participar de licitação nos Correios. No vídeo, Marinho diz ter o respaldo do deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ)).

Sobre esses e outros incontáveis trágicos exemplos nacionais, há um latente aspecto comum e determinante – a ineficiência da segurança institucional dos órgãos públicos, pois a ocorrência de fatos dessa gravidade demonstra a inequívoca falência dessas estruturas.
Na realidade, nossa conjuntura atual delineia um cenário pessimista porquanto a segurança institucional no país, além do diletantismo e despreparo profissional com a qual é exercida, é muitas vezes divorciada de sua destinação, seja para a consecução de interesses escusos de nossas autoridades, ou aquiescendo passivamente irregularidades internas. Foi o que assistimos em 2008 no festival de clandestinidades protagonizadas pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), na Operação “Satiagraha”, que levou o Presidente da República a afastar o seu Diretor-Geral e toda a cúpula da agência; na operação "Caixa de Pandora", em 2010, em que o governador do Distrito Federal (DF) era o principal articulador de um enorme esquema de corrupção, conhecido como “mensalão do DEM”, cuja gravidade levou o Procurador-Geral da República a solicitar intervenção federal no DF; e na operação “Mãos Limpas”, que prendeu o governador do Amapá e toda a cúpula do seu governo, envolvidos em desvios de recursos do estado.
A verdade é que sistemas de segurança, inteligência, ouvidorias, controladorias, corregedorias e todas as demais estruturas de segurança institucional (controle interno) só são eficientes e plenamente confiáveis se submetidos a rigoroso controle externo, sob a égide dos princípios constitucionais da publicidade e transparência; pois são estruturas especialmente vulneráveis à corrupção. Portanto, os responsáveis por essas atividades devem ser igualmente investigados pelo poder público, particularmente quando da ocorrência de contingências, sofrendo a devida responsabilização funcional; pois a ineficiência, em todas as suas formas de manifestação, constitui a maior ameaça à segurança institucional. Caso contrário, o país continuará a assistir à destruição do seu já combalido sistema imunológico, ante a inação e passividade da sociedade brasileira.
A genealogia dessa problemática demonstra a inépcia generalizada das autoridades públicas nacionais sobre a temática da segurança institucional, cujo exercício é caracterizado pelo empirismo e práticas viciosas. Muitas são as dificuldades e equívocos existentes a serem vencidos nessa seara, visando à implementação de uma segurança institucional eficiente. Nesse sentido, inicialmente há que se rever os fundamentos sobre os quais são edificadas essas estruturas, a começar pela melhor compreensão do que é segurança institucional.
Na realidade, a segurança que é majoritariamente praticada em nossas instituições é extremamente limitada, restringindo-se quase que exclusivamente a procedimentos de implantação de barreiras, controles de acesso, vigilância patrimonial e esforços envidados junto ao público interno no sentido de se criar e aprimorar uma mentalidade preventiva de segurança. Em que pese serem estas medidas relevantes e pertinentes ao caso em testilha, segurança institucional é uma temática muito mais abrangente e totalizante. Contudo, essa compreensão só é alcançada quando se responde à pergunta fundamental: "O que é segurança institucional?" Evidentemente, que essa questão suscitará inúmeras respostas que, diferentes entre si, demonstrarão o entendimento controverso dessa atividade, explicando o porquê da diversidade de suas práticas institucionais, desvelando um de seus problemas cruciais - a falta de uma doutrina oficial sobre segurança institucional, no país.
Destarte, se o principal propósito é a implementação de uma segurança eficiente, voltada para a proteção e salvaguarda do poder público nacional, devemos então saber o que o estado brasileiro entende por segurança. Esse contexto nos remete inevitavelmente à concepção e significado de "segurança nacionaL", cuja doutrina foi lançada ao olvido com o término do regime militar no Brasil, pela grande rejeição social à denominada Lei de Segurança Nacional, que vigorou nesse período.
Nesse mister, nosso diploma legal em vigor que trata dessa temática é o Decreto nº 5.484, de 30 de junho de 2005, que aprova a Política de Defesa Nacional. Nele, o estado brasileiro conceitua Segurança como sendo “a condição que permite ao País a preservação da soberania e da integridade territorial, a realização dos seus interesses nacionais, livre de pressões e ameaças de qualquer natureza, e a garantia aos cidadãos do exercício dos direitos e deveres constitucionais”. Por importante, vale destacar dois fundamentos ressaltados nesse diploma legal, quanto à concepção de segurança pelo estado, que são a “preservação da soberania e da integridade territorial; referente a pressões e ameaças de qualquer natureza”.
Isto significa que a segurança nacional implica a preservação de sua soberania, ante a qualquer tipo de ameaças. Desta forma, por analogia do referido decreto, podemos deduzir que segurança institucional é “a condição que permite à instituição pública a preservação de sua autonomia e o cumprimento de sua missão constitucional, livre de pressões e ameaças de qualquer natureza”. Portanto, a segurança institucional visa à completa proteção e salvaguarda do poder público, em toda a sua dimensão e espectro de atuação, contra qualquer tipo de ameaças.
Para cumprir plenamente sua destinação e atividade-fim a segurança institucional deve estruturar-se fundamentalmente em quatro áreas de atuação, a saber: governança corporativa, medidas ativas, medidas preventivas e medidas reativas.
A governança corporativa comanda a gestão organizacional, constituindo o seu centro decisor e irradiador da segurança institucional. É sua atribuição e competência a elaboração do Planejamento Estratégico, no qual a segurança institucional deve estar inserida, com sua respectiva concepção doutrinária própria. Nesse mister, vale ressaltar os equívocos doutrinários generalizados verificados no emprego das atividades de segurança institucional, da denominada atividade de inteligência, e da contra-inteligência. Conquanto sejam atividades afins quanto à salvaguarda institucional, há diferenças significativas quanto aos seus empregos, que devem estar claramente explícitos e delimitados no referido Planejamento Estratégico institucional.
A partir dele, a governança corporativa deve realizar o planejamento da segurança institucional propriamente dito, atentando para a importância da obtenção do equilíbrio entre segurança e o funcionamento eficaz da organização; evitar medidas de segurança excessivas; e o estabelecimento dos devidos controles institucionais, empregando para isso a gestão da informação e do conhecimento, bem como a tecnologia da informação. Para obtenção da plenitude da salvaguarda institucional, as ações de segurança devem alcançar as diversas atividades estruturais organizacionais, desdobrando-se nos seguintes segmentos:
  • Segurança da informação, referente à Política Nacional de Segurança da Informação; regida pelo Decreto no 3.505, de 13 de junho de 2000, que Institui a Política de Segurança da Informação nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal”;
  • Segurança das Operações, relacionada à sua atividade-fim;
  • Segurança Logística, relacionada à sua atividade-meio;
  • Segurança Econômica, relacionada à sua previsão e execução orçamentária; e
  • Segurança Administrativa, relacionada ao seu funcionamento eficaz.
Por fim, a governança corporativa é responsável pelas ações de fiscalização e auditoria das atividades de segurança institucional, primando pela sua eficiência e evitando sua perigosa degenerescência. Para esse mister, devem ser aplicados os preceitos constitucionais da publicidade e transparência, bem como implementado o controle externo das atividades de segurança, inteligência, ouvidorias, controladorias, corregedorias e todas as demais estruturas de segurança institucional.
A governança corporativa deve, ainda, estruturar o sistema de informações da organização, no qual o sistema de segurança institucional será parte integrante, visando ao assessoramento do processo decisório.
As medidas preventivas são de natureza passiva e podem ser classificadas em: ações de comando, direção e chefia; e segurança orgânica. As ações de comando, direção e chefia se referem à forma de exercício da condução institucional, por aqueles investidos dessa responsabilidade funcional, os quais devem ser selecionados não apenas por critérios técnicos e profissionais, mas também e principalmente por atributos morais e de liderança. Nesse contexto, as ações de comando, direção e chefia, constituem especiais medidas preventivas de segurança institucional, quando regidas rigorosamente pelos princípios do exemplo, da ética e da justiça; porquanto repercutem favoravelmente junto ao público interno, fortalecendo o seu sentimento psicossocial e o espírito de corpo institucional, proporcionando especial imunidade a todo tipo de ameaças à segurança.
A segurança orgânica é afeta exclusivamente à proteção da Informação organizacional produzida e sob sua custódia. É desenvolvida com medidas nas áreas de Segurança do Pessoal; Segurança da Documentação e material; Segurança das áreas e instalações, comumente chamada de Segurança Patrimonial; Segurança das Comunicações; e Segurança da Informática, ou meios informatizados. A segurança orgânica é parte integrante da Segurança da Informação, anteriormente referida como balizadora da Política Nacional de Informação, sendo esta muito mais abrangente. Vale registrar que a segurança orgânica constitui muitas vezes a única expressão de segurança existente em órgãos públicos que, desconhecendo sua aplicação restrita, erroneamente acreditam ser ela capaz de proporcionar a devida segurança institucional.
As medidas reativas referem-se à ação imediata quando da ocorrência de eventuais contingências institucionais e são implementadas por meio da execução de planos de contingência, sindicâncias, inquéritos e demais medidas de apuração internas que se fizerem necessárias. Em relação aos planos de contingência, estes são planejamentos produzidos em função do levantamento dos riscos e vulnerabilidades institucionais e da avaliação do comprometimento que suas eventuais ocorrências possam impactar à organização. Dessa forma são estabelecidos níveis de prioridade e elaboradas as respectivas ações a realizar em caso de suas ocorrências, bem como os procedimentos necessários para a manutenção do funcionamento institucional em condições mínimas de eficiência. Todavia, a realidade geral em nossas instituições é de pendência quanto à conclusão desses planejamentos, os quais muitas vezes sequer são iniciados. Contudo, o desafio subseqüente à elaboração dos planos de contingência é ainda maior, pois demanda as suas permanentes atualizações e, principalmente, a condução dos respectivos treinamentos com todo o público interno; sem os quais tais planejamentos, por melhores que supostamente possam parecer, se não tiverem sido verificados operacionalmente, não terão qualquer efetividade quando de seu acionamento numa eventual situação real.
As medidas ativas são de natureza ofensiva, no sentido de se antecipar às eventuais ameaças e agentes adversos à instituição. Todavia, sua viabilidade demanda possuir a devida capacidade de investigação, que muitas instituições abdicam exercer. Desta forma, mesmo com uma satisfatória segurança estruturada em bases preventivas, sem as referidas medidas de natureza ofensiva, tais organizações ficam permanentemente à mercê da ação de forças antagônicas desconhecidas. Portanto, a implementação de medidas ativas de segurança complementam todo o ciclo de segurança institucional, exercendo também importante papel como elemento dissuasório, inibidor de ameaças. As referidas medidas ativas podem ser realizadas em várias vertentes, destacando-se, dentre elas: a investigação e as operações de inteligência; a constituição de força de emprego; e o emprego da comunicação, por meio da propaganda e contrapropaganda.
Entenda-se por capacidade de investigação a possibilidade de emprego operacional de meios e recursos técnicos científicos para análise de provas, materiais e evidências, no sentido de perscrutar a verdade dos fatos, em bases objetivas e com alta credibilidade, reconhecidamente comprovada. Conquanto tal aparato seja próprio das estruturas policiais, vale considerar, em função das peculiaridades institucionais, a viabilidade de possuí-los, ou de solicitá-los a esses órgãos de investigação, em função de suas necessidades de segurança institucional. Vale dizer que a incapacidade institucional de realizar investigações dessa natureza representa evidente vulnerabilidade orgânica que, se identificada por agentes adversos, potencializa o risco de ameaças institucionais.
As operações de inteligência estão afetas à denominada atividade de inteligência, cuja doutrina de emprego deve constar do referido Planejamento Estratégico, integrada ao planejamento de segurança institucional, conforme anteriormente descrito. Contudo, destaca-se que esta é uma seara controversa e polêmica no país, cuja inépcia generalizada de nossas autoridades e dirigentes tem causado prejuízos ao melhor emprego das atividades de segurança e inteligência, pelo diletantismo com que ambas são exercidas. Nesse mister, em apertada síntese, ressalta-se que "operações de inteligência" nada mais são que uma forma diferenciada de investigação, caracterizada pelo emprego do sigilo operacional, o qual constitui sua atividade-fim. Todavia, seu emprego envolve elevado potencial de risco, exigindo adequada estrutura em recursos de material e pessoal, cujo capital humano devidamente qualificado nessa atividade técnica-especializada é extremamente raro no país. Portanto, o emprego das operações de inteligência só deve ser realizado em condições plenamente satisfatórias, sem o que constitui inclusive risco à segurança institucional. Todavia, constituem instrumento valioso, indispensável e insubstituível, tanto no assessoramento do processo decisório quanto na ação contra forças adversas.
A constituição de força de emprego representa o contingente em pessoal especializado para atuação na fiscalização interna, segurança ostensiva, exercendo papel de polícia no âmbito institucional. Essa atividade pode ser realizada com pessoal orgânico da instituição, ou de empresa idônea contratada para serviço terceirizado, destacando-se por importante a necessidade de rigoroso controle de contra-inteligência sobre seus integrantes.
“Nós ganhamos a guerra da revolução e perdemos a guerra da comunicação” é o ‘mea culpa’ veladamente assumido pelas mais nobres autoridades da Inteligência do Brasil, que comprova não apenas a importância da comunicação, mas principalmente o seu grande poder. Nesse sentido, o seu emprego é de grande valia para a segurança institucional, particularmente no contexto da propaganda e contrapropaganda que, atuando na expressão psicossocial, visam à obtenção de comportamentos predeterminados pelos diversos públicos de interesse. Por meio do emprego especializado da comunicação poder-se-á constituir um “exército invisível” e numeroso de colaboradores, no país e no exterior, indo ao encontro dos propósitos institucionais e conseqüentemente proporcionando a desejada segurança.
Por fim, lembremos que o principal e mais importante fator, não apenas para a consecução da segurança da organização, mas em todo o seu contexto institucional, são os seus recursos humanos. Assim, a segurança institucional deve atentar para a segurança do pessoal, desde o processo seletivo, passando pelo desempenho da função, até a fase do desligamento de seus integrantes; emprestando especial atenção ao recrutamento de capital humano das áreas institucionais consideradas críticas, que são aquelas onde são desenvolvidas atividades vitais e sensíveis para a instituição. Dentre elas, estão indubitavelmente os setores de segurança e inteligência; que, por serem atividades técnicas e especializadas, exigem pessoal altamente qualificado, submetido a permanente treinamento e reavaliação profissional. Nesse mister, por importante, vale ressaltar a necessidade da adoção de medidas especiais de segurança, voltadas notadamente para o recrutamento do capital humano dos seus cargos de direção e chefia, que devem ser ocupados por pessoal devidamente qualificado e estritamente orgânico da referida instituição. Tal assertiva é importante doutrina consolidada nas melhores práticas de segurança institucional, com inúmeros exemplos de graves contingências ocorridas no Brasil, decorrentes do seu descumprimento. Portanto, contrariar esse preceito fundamental de segurança institucional é já comprometê-la.
O anunciado futuro promissor do Brasil de ascensão ao seleto grupo das principais potências mundiais requer a devida contrapartida quanto à garantia da segurança nacional, a qual é estruturada a partir da salvaguarda do poder público, representado por nossas instituições. Protegê-las é muito mais que superar ameaças; é consolidar a sua própria eficiência e fortalecer a segurança do estado e da sociedade brasileira. 
Nesse contexto, a realização do 1o Congresso Brasileiro de Gestão do Ministério Público - Governança institucional”, patrocinado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), representa ingente contribuição ao Brasil no fortalecimento do debate democrático sobre esse e outros temas institucionais de grande relevância nacional.

Gastos de MPs estaduais são caixas-pretas

O Globo - 06/03/2011


Órgãos de fiscalização não cumprem resolução que obriga tornar públicas informações em portais da transparência
Thiago Herdy

BELO HORIZONTE. Órgãos criados justamente para fiscalizar o cumprimento da lei e coibir abusos cometidos por entes públicos, os ministérios públicos estaduais e do Distrito Federal fazem feio quando são convocados a tornar transparentes seus próprios gastos. Levantamento feito pelo GLOBO nos 27 portais da transparência, mantidos desde 2009 por esses órgãos, mostra que o detalhamento de gastos com diárias, cartão corporativo e contratação de terceirizados ainda é uma verdadeira caixa-preta da instituição, apesar de haver uma resolução do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) que obriga a divulgação desses dados na internet.
Apenas MP de Santa Catarina cumpre regra
O Ministério Público de Santa Catarina é o único no país que cumpre integralmente as determinações do CNMP, ao disponibilizar não apenas dados completos sobre a execução de orçamento, gestão de recursos e situação de funcionários, mas também detalhes minuciosos e motivação dos gastos de cada integrante com diárias.
Em 15 dos 27 portais regionais não há detalhamento dos gastos com viagens pagas pelo poder público. O assunto cartão corporativo é ignorado solenemente em 22 estados.
Embora a resolução do CNMP determine a publicação da lista com nome e função de cada trabalhador contratado por empresas prestadoras de serviço, apenas 14 cumprem a regra:
- Existem boas ideias e boa vontade, mas a estrutura acanhada do Conselho muitas vezes impede que realizemos um controle mais efetivo da aplicação da resolução - admite o representante do Senado no CNMP, Bruno Dantas.
O conselheiro aposta na aprovação de projeto legislativo que dá maior estrutura de pessoal ao órgão de controle da atividade do Ministério Público para que este problema comece a ser resolvido.
Nova resolução entrará em vigor ainda este ano
A necessidade de mais transparência na instituição levou Dantas a propor uma nova resolução tratando do tema, já aprovada pelos outros conselheiros e em vigor a partir do segundo semestre deste ano.
O novo texto prima pela clareza e exige a publicação de minúcias do trabalho dos promotores e servidores, como o CNPJ ou CPF de cada beneficiado de empenhos emitidos pelos órgãos, relação de participantes e valores propostos por cada empresa em licitações, quadro societário de firmas contratadas e divulgação de termos aditivos de contratos.
A nova resolução cobra, ainda, a publicação do telefone funcional de servidores e membros da instituição e o nome da autoridade solicitante e concedente de cada diária paga, além da descrição e o custo de quaisquer benefício concedido aos membros e servidores do Ministério Público, incluindo auxílio-moradia, auxílio-transporte, cotas de telefonia e serviços postais.


Rio, Minas e SP não justificam as viagens

Dos 20 itens exigidos, estados divulgam apenas seis
Thiago Herdy

BELO HORIZONTE. O representante do Senado no Conselho do Ministério Público, Bruno Dantas, que propôs a nova resolução que determina mais clareza na prestação de contas dos Ministérios Públicos, afirma que o grande desafio é impedir que ela vire uma "letra morta", como ocorreu com a primeira versão.
- A demanda por transparência foi acolhida em 2009, mas de uma maneira incipiente. Ao detalhar ainda mais as informações que devem constar nos portais, evitamos que informações genéricas dificultem o atendimento às determinações do conselho - explica Dantas, que destacou na resolução uma nova atribuição para a Comissão de Controle Administrativo e Financeiro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP): a fiscalização dos portais.
Entre os 20 itens de transparência até então cobrados pelo Conselho, apenas seis são divulgados por mais de 80% dos estados: orçamento total, despesa com membros e servidores ativos e inativos, gastos mensais com custeio e investimentos, servidores efetivos, rol de licitações e comprometimento com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas, um comportamento recorrente é o cumprimento correto de parte da resolução e muito ruim do restante.
MP do Rio Grande do Sul não revela contratos
As informações de diárias do MP de Rondônia, por exemplo, deveriam servir de modelo aos outros estados, por detalhar bem o motivo dos pagamentos. Mas o órgão falha na hora de apresentar dados de gestão fiscal. O MP da Paraíba vai além e coloca na íntegra relatórios de viagens realizadas por membros e servidores. Mas contratos, convênios e lista de servidores do estado nordestino estão com mais de um ano de atraso.
Estados com órgãos bastante estruturados, como Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, ainda não trazem justificativas detalhadas para o pagamento de diárias. O MP do Rio Grande do Sul inova ao disponibilizar convênios na íntegra, mas se esquece de mostrar receitas e contratos assinados.
- Se cabe ao Ministério Público exigir obediência aos princípios constitucionais, temos que dar a maior transparência possível aos nossos atos de gestão administrativa e ao gasto de nossos recursos - afirma o secretário-geral do MP de Santa Catarina, Ricardo Paladino, que já desenvolvia o portal que é modelo antes mesmo da resolução do CNMP determinando a divulgação de dados.
Uma equipe é responsável por manter o site atualizado e Paladino relata não ter havido qualquer resistência dentro do órgão quando se decidiu divulgar dados de viagens com detalhamento.
 

quinta-feira, 3 de março de 2011

Arapongas da Abin na Satiagraha foi ilegal, afirmam ministros


MARIANGELA GALUCCI e FAUSTO MACEDO, de O Estado de S. Paulo
A participação de 76 arapongas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) na Operação Satiagraha foi ilegal, concluíram os ministros Adilson Macabu (desembargador convocado) e Napoleão Nunes Maia Filho, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Eles acolheram os argumentos da defesa do banqueiro Daniel Dantas, que em habeas corpus requereram a anulação das provas obtidas pela Polícia Federal e a extinção da ação penal que condenou o dono do Grupo Opportunity a 10 anos de prisão por corrupção. O julgamento no STJ foi interrompido pelo ministro Gilson Dipp, que pediu vista dos autos.
O engajamento dos agentes da Abin é um ponto emblemático da Satiagraha, desencadeada em julho de 2008 pela Polícia Federal. Durante a fase de interceptação telefônica e monitoramento de Dantas e outros alvos da missão, o delegado Protógenes Queiroz, agora deputado (PC do B-SP), recrutou os arapongas e a eles passou a incumbência de analisar as escutas.
A aliança PF/Abin abriu caminho para a defesa requerer a anulação dos procedimentos de escuta telefônica, interceptação telemática de e-mails e da ação controlada - etapas da investigação que embasaram o processo criminal que levou Dantas ao banco dos réus. O Ministério Público Federal pediu anulação da ação penal com base na clandestinidade da atuação da Abin.
Adilson Macabu, relator, votou pela concessão do habeas corpus - o ministro Maia Filho o acompanhou. O relator avalia que o inquérito contém vícios que "contaminam" todo o processo. Para Macabu, foi irregular a mobilização dos quadros da Abin, sob coordenação de Protógenes, pois foge das atribuições legais da agência criada para assessorar a Presidência da República.
 

terça-feira, 1 de março de 2011

Carta aberta aos oficiais de inteligência da ABIN


CARTA ABERTA AOS OFICIAIS DE INTELIGÊNCIA DA ABIN

                                                      
Senhores,
             A revista “ISTO É” editada em 16/02/2011 publicou matéria dando conta de insatisfação de uma parcela de integrantes da ABIN, por motivações diversas. Chamaram-me a atenção algumas alegações radicalizadas típicas de quem tem interesses contrariados com vínculos ideológicos exacerbados: ”herança maldita”, “ovo de serpente”, “ex-integrante do SNI”, ex-R2, “parente de general do tempo da repressão”, denúncia de que a ABIN ”monitora o MST”, adjetivação de “araponga” etc.
             Ora, senhores, todos temos herança de alguma coisa de que não gostamos; mas ninguém tem o direito de generalizar as suas opiniões para denegrir a própria Instituição a que serve ou alguns profissionais dela integrantes, por suas origens, muito menos sem o conhecimento de causa suficiente para julgar.
             Creio que ainda esteja escrito numa parede da  antiga ESNI a frase de “um general do tempo da repressão” que deve continuar norteando a sua classe profissional:“ A VERDADE É A ESSÊNCIA DA INFORMAÇÃO”; ou será que apagaram porque foi escrita por um general?
             O profissional de Inteligência, além de capacitado intelectualmente, precisa ser detentor de equilíbrio psicológico que o habilite a suportar as adversidades de antipatias e opiniões sectárias, particularmente do jornalismo descomprometido com a verdade que também está cheio de “arapongas”.
             O operador da área de Inteligência precisa entender que não é dono do conhecimento que produz nem pode cobrar do usuário final qualquer decisão consequente; se a sua agência monitora A, B ou C, é o Presidente da República, como usuário final, quem decide quanto à sua utilidade.
             Agora, senhores, levar a público a natureza do trabalho investigativo é o pecado mortal de integrantes de qualquer Serviço de Inteligência. Se fazem isso para agradar a setores de um partido político, lembrem-se que trabalham para uma Chefe de Estado.
              Muitos militares ou ex-militares foram selecionados para os serviços de Inteligência por suas virtudes cultivadas e provadas nas suas Instituições de origem e  por que são homens disciplinados afeitos ao trabalho diuturno, e não trabalham de olho no relógio ou no próximo fim de semana. A sua disciplina e dedicação repassadas à corporação, certamente, incomodam àqueles que não tiveram a sorte de passar pelo cadinho em que se forja o caráter, se cultiva a virtude e se fortalece a vontade.
             Se os senhores alimentam esse ultrapassado ranço contra militares, que sejam ao menos responsáveis para entender que alimentar antagonismo entre Órgãos de Inteligência é prestar um desserviço ao Estado e ao próprio governo, por suas perturbações inconsequentes.
             Libertem-se das suas ideologias, sejam lá quais forem, ajam como verdadeiros homens de Inteligência ou mudem de emprego; por que esse é um sacerdócio e um estilo de vida.
TC REF JOSÉ GERALDO DA SILVA                                               
  ”A VERDADE É A ESSÊNCIA DA INFORMAÇÃO”   

Fórum da Inteligência

Este é um espaço destinado ao debate e à manifestação democrática, livre, coerente e responsável de idéias sobre Inteligência.