Artigo de André Soares - 24/07/2012
Uma
grave realidade da atual conjuntura nacional é que o Brasil está
vulnerável à atuação de organizações clandestinas internacionais,
especialmente à ação adversa de serviços de inteligência estrangeiros e
grupos terroristas. Isso porque os governantes encobrem da sociedade que
a Inteligência de Estado no Brasil está na UTI, em estado gravíssimo,
devido à ineficiência e desvirtuamento dos seus serviços secretos. A
sociedade brasileira também desconhece que a Inteligência nacional está completamente fora de controle do estado constituído,
protagonizando impunemente a gênese de ingentes escândalos, crimes e
tragédias, atentatórios ao estado democrático de direito vigente e à
soberania nacional. Não por acaso, o Brasil sofre atualmente
a eclosão da pior crise institucional de inteligência de sua história,
incipientemente revelada no festival de clandestinidades da Operação
Satiagraha, em 2008, patrocinadas pela direção-geral e toda a cúpula da
Agência Brasileira de Inteligência (ABIN).
“Não
imaginei que havia criado um monstro” foram as célebres palavras de
arrependimento proferidas pelo General Golbery do Couto e Silva, ante à
degenerescência do Serviço Nacional de Informações (SNI), criado pela
lei 4.341, de 13 de junho de 1964, do qual foi um dos principais
idealizadores, e que culminou com sua extinção no governo Fernando
Collor de Melo. Como o presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) não se
afastou dos erros passados ressuscitou no Brasil o fantasma do antigo
SNI, instituindo no país a ABIN, pela Lei 9883, de 07 de dezembro de
1999, como órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN).
Com pouco mais de uma década de existência, a história da ABIN se
caracteriza por sua generalizada ineficiência, contaminando todo SISBIN e
por uma sucessão de escândalos e crises institucionais de âmbitos
nacional e internacional, cujas danosas consequências implicaram a
exoneração de vários de seus diretores-gerais.
Se
por um lado é incontestável a importância da Inteligência no contexto
do estado constituído, no caso brasileiro há muito por fazer e os
desafios são muitos. A começar pela promulgação de uma Política Nacional
de Inteligência, pois a sua inexistência fomenta o desvirtuamento dessa
atividade; a revisão e aperfeiçoamento dos nossos diplomas legais,
começando pela embrionária e equivocada Lei 9883, que cria a ABIN; a
estruturação de um verdadeiro e legítimo sistema nacional de
inteligência, que prime pela ética e legalidade de suas ações,
congregando os poderes da república, ministério público e entes
federativos; a ruptura da “caixa preta” dos serviços de inteligência
nacionais, cuja prestação de contas deve submeter-se impiedosamente ao
princípio constitucional da publicidade; a renovação dos cargos de
direção da ABIN e SISBIN, dominados pela “comunidade de inteligência”; e
a responsabilização direta, funcional e criminal de todos os operadores
de inteligência pelo seu desempenho, a começar pelos dirigentes máximos
desses serviços.
Nesse mister, vale ressaltar a firme decisão da presidenta
Dilma Rousseff ao promulgar a Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011,
instaurando a “Comissão da Verdade”, para resgatar o nosso recente
passado histórico. Todavia, resta saber se nossa presidenta terá
a coragem e a força que faltaram aos seus predecessores para vencer a
“comunidade de inteligência” que governa os serviços secretos do país.
Porque é do maior interesse nacional que a “Comissão da Verdade” estenda
seus trabalhos investigando também as clandestinidades cometidas pela
ABIN e o SISBIN, que encobrem verdades proibidas sobre a história do
Brasil.
Esta
magnânima contribuição seria um alvissareiro momento histórico no país,
em seu fortalecimento como estado de direito e engrandecimento como
nação democrática. Inaugurar-se-ia, assim, uma nova e eficiente Inteligência nacional, salvaguardando o estado brasileiro de vitimar-se com os crimes protagonizados por serviços secretos nacionais desvirtuados, como na Satiagraha; evitando também que o Brasil volte a sofrer atentados à soberania nacional, como a explosão do foguete brasileiro VLS-1, no Centro de Lançamento de Alcântara/MA, em 2003, que além dos incalculáveis prejuízos causados ao nosso estratégico projeto aeroespacial, assassinou impunemente 21 cidadãos brasileiros.
“A Inteligência é um apanágio dos nobres. Confiada a outros, desmorona".
(Coronel Walther Nicolai - 1873/1934 - Chefe do Serviço de Inteligência do Chanceler Bismarck)
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