segunda-feira, 31 de maio de 2010

O Brasil sem história

André Soares
Mestre em operações militares e diretor-presidente de Inteligência Operacional


Publicado no jornal Correio Braziliense, em 31/05/2010

“O povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la.” É reflexão muito conhecida que, lamentavelmente, se aplica perfeitamente ao Brasil. Todos os brasileiros têm conhecimento, em maior ou menor grau, sobre fatos marcantes da história da humanidade, desde a antiguidade. Entretanto, nenhum cidadão brasileiro conhece significativa parcela da história contemporânea nacional dos últimos 60 anos. Isso porque, pior que um país que não conhece a própria história, é um país que a perdeu; e o Brasil é um infeliz exemplo dessas duas tragédias.

O primeiro ensinamento que todo cidadão deveria obrigatoriamente aprender é que “a história é contada pelos vencedores”. Portanto, existem duas — a oficial e a verdadeira. A história oficial é evidentemente a dos vencedores, a qual é massivamente e difundida à sociedade e especialmente direcionada aos jovens. Porém, é a história verdadeira a que o cidadão deveria se empenhar em conhecer. As informações divulgadas sobre o período obscuro do país denominado “anos de chumbo” (ou seria “período da subversão”?) são originalmente tendenciosas e referem-se a um passado que existiu de fato, mas não de direito; e o Brasil é incapaz de contar sobre ele até mesmo a sua história oficial — a dos vencedores. Afinal, quem são os vencedores?

Quanto a isso, governos militares e civis efetivamente nada fizeram, pois essa verdade compromete indistintamente a todos; sendo, por isso, unanimemente sepultada e esquecida aos olhos da sociedade, cuja investigação sempre foi perigosamente proibida. Assim, todas as tentativas de resgatar essa história foram pífias, oficiosas, eivadas de manipulação e inverdades. Atualmente, o governo Lula mobiliza-se na busca das ossadas dos desaparecidos políticos. E o Ministério Público e Poder Judiciário peregrinam há décadas pela abertura dos “arquivos da ditadura”, coadjuvados pelo apoio de outras entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que lançou recente campanha nacional nesse sentido.

O resultado de tudo isso? Praticamente nada. Nada de ossadas de desaparecidos políticos, nada de abertura de arquivos da ditadura, nada de história oficial; e quanto à história verdadeira, essa nem pensar! “Apagar” o passado é muito mais difícil que contá-lo e, assim, vivemos num Estado constituído impotente em revelá-lo e ineficiente em prestar contas à sociedade, vencido que foi pelo medo daqueles que “desaconteceram” a história nacional, pelo muito que têm a esconder, a temer e a pagar.

Nesse contexto, as ossadas dos desaparecidos políticos foram alvo de ações clandestinas cirúrgicas. Ministério Público e tribunais não conseguem vencer a blindagem da maior “caixa-preta” do país que são os próprios serviços de inteligência, cuja publicidade de suas ações sigilosas permanece inacessível, em flagrante e arrogante desrespeito ao texto constitucional e ao Estado Democrático de Direito vigentes. Todavia, mesmo que esse sonho se torne realidade, nada será encontrado além de toneladas de documentos irrelevantes, porque tudo o que o país deveria conhecer sobre essa história foi meticulosamente destruído. Nada restou.

Sem ossadas, sem arquivos, sem passado, mas não sem “histórias” porque subsiste a disputa fratricida das versões. Assim, a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República lançou o livro Direito à memória e à verdade, que se autodenomina livro-relatório. Perigosamente ameaçados pela versão da esquerda, atualmente no poder, setores de uma direita sem rosto tenta, em contrapartida, divulgar a sua versão à sociedade, revelando clandestinamente um extenso dossiê secreto de codinome Orvil (a palavra livro ao contrário), produzido pelos mesmos serviços de inteligência, os quais não o divulgaram durante as décadas em que se esbaldaram no poder.

A lei de anistia de 1979, cujos efeitos foram ratificados em recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), foi um marco nacional a pretexto de inaugurar um novo período de concórdia, reconciliação e sem revanchismo. Todavia, esse fato político degenerou-se em amnésia histórica, indústria extorsiva de indenizações contra o Estado e impunidade generalizada para assassinos, torturadores, sequestradores e terroristas; que a Suprema Corte do país esquivou-se de corrigir.

O Brasil sem história já está revivendo os próprios erros, e a sociedade inepta caminha às cegas na sua ignorância para decidir mais um pleito presidencial incapaz de distinguir cidadãos de criminosos. Nossa verdade histórica é um livro de páginas arrancadas e os poucos ainda vivos que as conhecem e não se prostituíram na corrupção assistem a um Brasil sem passado, ao qual resta apenas vagar perdido sem identidade, ou se encontrar na mentira dos perdedores.

domingo, 30 de maio de 2010

O futuro

De André Soares


Viver é ter esperança, afinal, “a esperança é a última que morre”. Como ter esperança é ter a expectativa de um futuro melhor, sem expectativa de futuro morre a esperança e, assim, a vida. Portanto, vivemos de futuro.

Se a esperança é a força de acreditar; o futuro, o que é?

Segundo uma conhecida expressão, a única afirmação que podemos fazer sobre o futuro é que “a longo prazo, todos estaremos mortos”.

Certo, ou errado?

Errado.

A realidade é ainda mais trágica, pois só podemos afirmar que “no futuro, todos estaremos mortos”, porque não há a garantia sequer de que a nossa morte ocorrerá “a longo prazo”. Quem dera!

Assim, o futuro, na verdade, passa a ser o nosso maior problema porque todos sabemos o que ele nos reserva.

Isso nos leva ao paradoxo de lutarmos desesperadamente contra o nosso próprio futuro, que é o maior propósito da nossa própria esperança.

Passando então a evitá-lo de todas as formas, vivemos na expectativa desesperadora da criação, ou descoberta, de qualquer outro futuro, que não seja a morte.

Assim, a vida retoma a sua força, pois renasce a esperança - a esperança de um futuro.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

ÉTICA, ABIN E POLÍCIA FEDERAL

Hércules Rodrigues de Oliveira – Professor universitário, mestre em administração

Fernando Savater, em Ética para meu filho, diz que “podemos viver de muitos modos, mas há modos que não nos deixam viver”, por sua vez o saudoso poeta gaúcho Mário Quintana nos ensinou que: “A arte de viver é simplesmente a arte de conviver, mas como é difícil”. Certamente que nada na vida é fácil, entretanto uma questão é inquestionável, nunca concordamos com todos, assim sendo, muito embora não possamos escolher o que a vida nos reserva, podemos sim, escolher o que fazer diante do que nos acontece na vida. Isso é liberdade, ou seja, a capacidade individual em escolher dentro da própria vontade, pois ninguém pode ser livre em nosso lugar nem tão pouco de viver a vida inventada pelos outros. É na ética e não na estética que, iremos encontrar ajuda para exercer a virtude da tolerância e ato contínuo da prática da convivência fraterna entre os homens e principalmente entre organizações, sejam elas públicas ou privadas. Indubitavelmente que o princípio moral da ética da reciprocidade, presente em religiões e culturas, substitui a Lei de talião, retribuição ativa do “olho por olho”, para regozijar-se na regra de ouro, enquanto atitude passiva e por empatia acreditar no pensamento de Confúcio: “Não façais aos outros aquilo que não quereis que vos façam”. Mas, como disse Nietzsche, somos humanos, demasiadamente humanos e na busca pela felicidade, direito inalienável do homem, este sem perceber acaba por praticar o mal, como desafortunadamente vem ocorrendo com a campanha salarial da lídima e reconhecida Polícia Federal (PF) cujos vencimentos estão aquém da capacidade operacional da instituição que tanto contribui para a transparência Brasil. Entretanto, alguns de seus dirigentes classistas adotaram uma postura antiética e no mínimo deselegante em querer desmerecer os integrantes da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) como vem sendo de forma contumaz noticiado pela mídia como contraponto do que entendem por baixo salário. Poder, cultura e ética caminham juntas em todas as organizações. Que motivos levam os senhores dirigentes sindicais a orquestrarem inverdades a respeito da carreira de Inteligência para justificar remuneração que consideram impróprias ao Policial Federal? A ABIN só está à frente da douta Polícia Federal apenas no dicionário de verbetes. Assim como a muito digna Polícia Federal, a ABIN também exerce o múnus público. Em verdade são todos filhos do mesmo útero; o Estado Democrático e de Direito da República Federativa do Brasil. Utilizando-se de dados inverídicos eles promovem de forma gratuita, perante a opinião púbica, antipatia pela Atividade de Inteligência, colocando os integrantes da Polícia Federal, como vítimas de um sistema que querem dar a entender, ser desigual e não meritório. Sem pudor, informam que o profissional de Inteligência recebeu aumento salarial na ordem de 500%, ofendem sua integridade quando afirmam que a ABIN faz trabalho menos perigoso e representativo para o país, discriminam quando citam que a remuneração da PF é menor que de outras categorias que exigem qualificação inferior ou semelhante aos profissionais da ABIN. Informações sobre questões salariais e qualificação de cargos para o serviço público federal podem ser obtidos por qualquer cidadão em fontes abertas no Ministério do Planejamento. Certamente que com finalidades específicas, devidamente delineadas pela Carta Magna, cumprem cada organização a sua esfera de atribuição, todas com zelo e parcimônia. A mídia tem muito contribuído em divulgar as excelentes e exitosas operações da Polícia Federal, entretanto, devido o perfil do profissional de Inteligência, estes se mantém silentes. O silêncio da ABIN a respeito de suas atividades de salvaguarda do Estado brasileiro não pode ser entendido como fraqueza, mas nela repousa a sua maior força, pois assim é a nobre Atividade de Inteligência. De boa lembrança o registro histórico da Operação Satiagraha, onde houve mais baixas nos mocinhos (ABIN e PF) do que nas hordas dos malfeitores que dilapidam diuturnamente as riquezas de nossa terra via a corrupção institucionalizada. Que o profissional Polícia Federal continue a ser valorizado como o agente imprescindível no desenvolvimento de nossas instituições e na segurança de nossos valores, nossa família, nossa bandeira, nossa República, nosso país.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Curso "Operações de Inteligência em Inteligência de Estado"

Operações de Inteligência em Inteligência de Estado

Olá.
Conheça o curso "Operações de Inteligência em Inteligência de Estado".

Autor do curso:
André Soares

Identificação do curso:
Este curso trata dos conhecimentos doutrinários fundamentais sobre "Operações de Inteligência" e está inserido no contexto da Inteligência de Estado, ou Inteligência Clássica, relativo ao emprego do segmento de Operações de Inteligência, que é o setor mais sigiloso dos Serviços de Inteligência. Apresenta os conhecimentos doutrinários fundamentais da Inteligência de Estado e do emprego das Operações de Inteligência, bem como os diplomas legais em vigor e as questões éticas que envolvem essas atividades.
Objetivo:
Visa contribuir para o aperfeiçoamento da Cidadania e do Estado Democrático de Direito, no Brasil, proporcionando os conhecimentos básicos necessários para o emprego das Operações de Inteligência de forma institucional e em obediência aos princípios constitucionais, por parte das pessoas, organizações e instituições públicas que exerçam a Inteligência de Estado e empregam o segmento de Operações de Inteligência.
Público-alvo:
• É destinado a todas as pessoas que pretendam maiores conhecimentos sobre "Operações de Inteligência", atividade de Inteligência e Inteligência de Estado;
• É recomendado a servidores públicos como membros do Ministério Público, promotores, magistrados, policiais, militares, delegados, agentes, advogados, psicólogos, gestores públicos, dentre outros.
• É de especial interesse para dirigentes, diretores, coordenadores e integrantes dos sistemas de inteligência, particularmente analistas e operadores de inteligência do segmento de Operações de Inteligência.
Benefícios, vantagens, possibilidades e aplicações
• Conhecer os fundamentos do emprego das Operações de Inteligência no contexto dos Serviços de Inteligência.
• Conhecer a doutrina e os diplomas legais em vigor que regem o emprego das Operações de Inteligência no Brasil.
• Conhecer as questões éticas que envolvem o emprego das Operações de Inteligência e suas implicações.
• Conhecer as ameaças que as Operações Clandestinas representam para o Estado Democrático de Direito.
• Compreender a realidade das Operações de Inteligência, no contexto da Inteligência de Estado, no Brasil.
• Conhecer o emprego das principais Técnicas Operacionais de Inteligência.
• Conhecer os principais fundamentos que envolvem o Planejamento das Operações de Inteligência, pelos serviços de inteligências no Brasil.
• Conhecer o valor probatório da Inteligência em todos os níveis de seu emprego, nas ações de Investigação e em processos judiciais.
Carga horária:
A carga horária do curso é de 80 (oitenta) horas.
Inscrição:
• Maiores de 18 anos.
• Após a confirmação da inscrição, a mesma tem validade de 120 dias consecutivos.
Certificado de conclusão de curso:
Ao concludente do curso "Operações de Inteligência em Inteligência de Estado" será conferido o correspondente certificado de conclusão do curso, devidamente reconhecido e validado por Inteligência Operacional, sendo expedido originalmente criptografado e personalizado, com numeração de natureza pessoal e intransferível.
Programa:
Faça uma visita ao curso "Operações de Inteligência em Inteligência de Estado" e conheça o seu programa.

terça-feira, 18 de maio de 2010

INTELIGÊNCIA, MEMÓRIA E MUSEUS

Hércules Rodrigues de Oliveira – Professor universitário, mestre em administração

Musas na mitologia greco-romana são as nove filhas de Zeus e Mnemosine, a deusa da Memória, filha de Gaia, a deusa da Terra. Às musas, todas sempre belas, são atribuídas a capacidade de inspirar tanto a criação artística quanto a científica. O templo delas, em grego antigo, chamava-se mouseion, termo que deu origem a palavra museu, entendido como “o refúgio das Musas”. Pitágoras transformou o culto às Musas em estudos científicos. Ptolomeu II, amante da filosofia e inebriado pelo conhecimento, construiu o Museu de Alexandria – que mais tarde se transformaria na famosa Biblioteca do oriente – que funcionava como uma universidade onde professores dedicavam-se à pesquisa. Durante séculos, magistrados, filósofos, políticos e cientistas de todo mundo antigo por lá passaram contando e escrevendo a história da poesia, da matemática, da medicina, da astronomia entre tantas outras ciências. Hipátia aluna, professora e diretora estudou, trabalhou e dirigiu o refúgio das musas onde dedicou-se em desvendar os enigmas que tinham desafiado Euclides e Arquimedes. Nem parece mulher, diziam os machistas de então, querendo elogiar sua inteligência. A intolerância religiosa à época, não só matou Hipátia como destruiu o museu, pois como um centro de irradiação do conhecimento tinha como mote o ensino politeísta, o que era inadmissível para o progresso do Cristianismo. Dezoito de maio é o Dia Internacional dos Museus, efeméride de expressiva tradição universal, proposto em 1977 pelo Conselho Internacional de Museus (em inglês: International Council Of Museums, ICOM), com sede em Paris/França. Nas Gerais 73 instituições abrem as portas para mostrar rico acervo historiográfico, marcas indeléveis de nosso povo, nossa gente, expostos com arte e graça para despertar no homem a curiosidade e o respeito por aqueles que nos antecederam e que construíram nossos valores, nossa cultura. Nos museus encontramos os vestígios do passado que Galeano bem o disse: “Nasceram há milhares de milhares de anos, mas nascem de novo cada vez que alguém as vê”. O tema deste ano no 4ª Fórum Nacional de Museus é o Direito a Memória, que de tão significativa para os filhos de Prometeu tem a sua deidade, Mnemosine, que nos protege do esquecimento. Platão ao escrever Fedro, relata a fala do faraó Thamus com o deus egípcio do conhecimento Thot que lhe apresentava a invenção da escrita, sob o argumento que seria o melhor remédio para curar a memória ruim e a pouca sabedoria, mas ele o recusou dizendo que aquele invento produziria o esquecimento. Por certo que aquele monarca não deseja nada esquecer, pois segundo ele: “não se pode recordar com memória alheia”. Para alguns especialistas temos três tipos de memória: a orgânica que é feita de carne e de sangue e que é administrada pelo cérebro. A mineral, escrita pela humanidade em tijolos de argila e em obeliscos e que num salto gigante se faz presente nos computadores com o silício e por fim a vegetal, primeiro em papiros para depois se eternizar em livros. Mas o que a Atividade de Inteligência tem a ver com isso? Tudo. Museus são instituições de caráter permanente que guardam nossos símbolos e valorizam a nossa identidade. Museus preservam a história de um povo, de uma nação, de uma organização, como exemplo o Memorial de Inteligência da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), ou a Memória do Judiciário Mineiro (Mejud), criado em 1988, dos Correios e Telégrafos e tantos outros. Museus representam em essência as várias formas das sociedades humanas, o seu passado e o seu presente, as maneiras de como dispomos nossa cultura material. O museu desnuda nossas forças e nossas fraquezas, por isso nossa memória tem de ser protegida e não escondida. Museus mostram ameaças e oportunidades, só não as vê quem não quer. As informações que são traduzidas em seu rico acervo sejam cultural, ambiental, artístico, histórico, científico, técnico, transformam-se em conhecimentos e como tal necessitam e precisam ser protegidas. Olhando o passado distante e construindo a história de cada povo podemos vaticinar até onde poderá chegar o seu desenvolvimento econômico. Um povo que inova tem condições de salvar a aventura humana na terra. Museus carregam esta história. Se quiseres conhecer o grau de desenvolvimento de uma nação, visite seus museus que a resposta estará cristalina. Museus materializam experiências não vividas pela práxis daqueles que fizeram e como um passe de mágica nos transporta em emoções e a certeza de que tudo é possível. Façamos do museu o nosso lugar de encontro. Passado presente e futuro, pois a vida sem memória é vivida sozinha.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

O Brasil sem história

Artigo de André Soares, publicado no jornal Estado de Minas - 12/05/2010.

“O povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la” – reflexão muito conhecida, que, lamentavelmente, se aplica perfeitamente ao Brasil. Todos os brasileiros têm conhecimento, em maior ou menor grau, sobre fatos marcantes da história da humanidade, desde a antiguidade. Entretanto, nenhum cidadão brasileiro conhece significativa parcela da história contemporânea nacional dos últimos 60 anos. Isso porque pior que um país que não conhece a própria história é um país que a perdeu, e o Brasil é um infeliz exemplo dessas duas tragédias. O primeiro ensinamento que todo cidadão deveria obrigatoriamente aprender é que “a história é contada pelos vencedores”. Portanto, existem duas – a oficial e a verdadeira.

A história oficial é evidentemente a dos vencedores, a qual é massivamente difundida à sociedade e especialmente direcionada aos jovens. Porém, é a história verdadeira a que o cidadão deveria se empenhar em conhecer. As informações divulgadas sobre o período obscuro do país denominado “anos de chumbo” (ou seria “período da subversão?”) são originalmente tendenciosas e referem-se a um passado que existiu de fato, mas não de direito. O Brasil é incapaz de contar sobre ele até mesmo a sua história oficial – a dos vencedores. Afinal, quem são os vencedores?

Quanto a isso, governos militares e civis efetivamente nada fizeram, pois essa verdade compromete indistintamente a todos, sendo, por isso, unanimemente sepultada e esquecida aos olhos da sociedade, cuja investigação sempre foi perigosamente proibida. Assim, todas as tentativas de resgatar essa história foram pífias, oficiosas, eivadas de manipulação e inverdades. Atualmente, o governo Lula mobiliza-se na busca das ossadas dos desaparecidos políticos e Ministério Público e Poder Judiciário peregrinam há décadas pela abertura dos “arquivos da ditadura”, coadjuvados pelo apoio de outras entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que lançou recente campanha nacional nesse sentido.

O resultado de tudo isso? Praticamente nada. Nada de ossadas de desaparecidos políticos, nada de abertura de “arquivos da ditadura”, nada de história oficial. Quanto à história verdadeira, essa nem pensar! “Apagar” o passado é muito mais difícil que contá-lo e, assim, vivemos num estado constituído impotente em revelá-lo e ineficiente em prestar contas à sociedade, vencido que foi pelo medo daqueles que “desaconteceram” a história nacional, pelo muito que têm a esconder, a temer e a pagar. Nesse contexto, as ossadas dos desaparecidos políticos foram alvos de ações clandestinas cirúrgicas. Ministério Público e tribunais não conseguem vencer a blindagem da maior caixa-preta do país que são os seus próprios serviços de inteligência, cuja publicidade de suas ações sigilosas permanece inacessível, em flagrante e arrogante desrespeito ao texto constitucional e ao Estado democrático de direito vigentes. Todavia, mesmo que esse sonho se torne realidade, nada será encontrado além de toneladas de documentos irrelevantes porque tudo o que o país deveria conhecer sobre essa história foi meticulosamente destruído. Nada restou.

Sem ossadas, sem arquivos, sem passado, mas não sem “histórias” porque subsiste a disputa fratricida das versões. Assim, a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República lançou o livro Direito à memória e à verdade, que se autodenomina livro-relatório. Perigosamente ameaçados pela versão da esquerda, atualmente no poder, setores de uma direita, sem rosto, tenta, em contrapartida, divulgar a sua versão à sociedade, revelando clandestinamente um extenso dossiê secreto de codinome “Orvil” (a palavra livro, ao contrário), produzido pelos mesmos serviços de inteligência, os quais não o divulgaram durante as décadas em que se esbaldaram no poder. A Lei de Anistia (1979), cujos efeitos foram ratificados em recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), foi um marco nacional a pretexto de inaugurar um novo período de concórdia, reconciliação e sem revanchismo. Todavia, esse fato político degenerou-se em amnésia histórica, indústria extorsiva de indenizações contra o Estado, e impunidade generalizada para assassinos, torturadores, sequestradores e terroristas; que a Suprema Corte do país esquivou-se de corrigir.

O Brasil sem história já está revivendo seus próprios erros e a sociedade inepta caminha às cegas na sua ignorância para decidir mais um pleito presidencial, incapaz de distinguir cidadãos de criminosos. Nossa verdade histórica é um livro de páginas arrancadas e os poucos ainda vivos que as conhecem e não se prostituíram na corrupção assistem a um Brasil sem passado, ao qual resta apenas vagar perdido sem identidade, ou se encontrar na mentira dos perdedores.

Lançamento do livro "Fundamentos da Inteligência Competitiva"

sexta-feira, 7 de maio de 2010

INTELIGÊNCIA E CINEMA

Hércules Rodrigues de Oliveira – Professor universitário, mestre em administração


Aristóteles dizia que o espírito nunca pensa sem imagens. Talvez por isso seja tão prazeiroso vivenciarmos o jogo da ficção onde a tratativa poética contrapõe a questão histórica, transportando para o reino do possível, aquilo que sem ser real é credível, ou que tenha ou possa ter acontecido. Assim é a arte cinematográfica que se explica em parte, por antigo provérbio: “Aquilo que os olhos não vêem o coração não sente”. A obra fílmica tem o poder de abrir sempre novas perspectivas para a arte além, é claro, de chegar ao público de maneira direta e em massa. Neste aspecto estréia em circuito nacional de cinema no dia 7 de maio, a película “Segurança Nacional” que, de forma inédita, aborda o trabalho de um agente de Ações Especializadas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), de nome Marcos Rocha, interpretado pelo não menos famoso Thiago Lacerda. No filme podemos ver entre outros aspectos, a importância do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin), atuando como Inteligência de Estado, em parceria com as Forças Armadas e órgãos de Segurança Pública contra um inimigo externo. Coincidências a parte, dia 7 é dia do silêncio. É cediço que desde os tempos primevos, o silêncio carrega consigo importante elemento cultural que impõe severamente aos homens, a necessidade de salvaguardar seus segredos. O silêncio é tão importante que existe uma deidade que o protege: Harpócrates. Reparem que o som do silêncio é poderoso e seu grito ensurdecedor. É no silêncio sepulcral da Atividade de Inteligência que os seus operadores, homens e mulheres da Abin, trabalham na assessoria do processo decisório da ação governamental. Para muitos o silêncio de seus operadores pode ser sinônimo de fraqueza, mas é nele, no silêncio, que repousa a sua maior força. Wilhiam James filósofo inglês, dizia que: “O exercício do silêncio é tão importante quanto à prática da palavra”. Segurança Nacional vem a reboque de instigantes temas abordados pelo cinema brasileiro, haja vista o sucesso inequívoco de Cidade de Deus e Tropa de Elite, ambos no contexto de se pensar melhor as questões da segurança pública e da fragilidade do homem diante de questões inelutáveis. De boa lembrança que a primeira investida da dramaturgia nacional sobre o tema Informação/Inteligência, ocorreu com Tarcísio Meira que representava o agente bem “trapalhão” Aristênio Catanduva, que se utiliza de um codinome “Araponga”, parodiando o eterno 007 James Bond que na verdade estigmatizou uma nobre atividade de proteção de todo estado nacional moderno, como bem disse Dan Raviv: “Todo espião é um príncipe”. Do substantivo Araponga derivou-se o adjetivo funesto “arapongagem” para designar Atividade de Inteligência. Lembremo-nos que o jornalismo investigativo de profunda contribuição para os aspectos da transparência Brasil, também procura pelo dado negado. Segurança Nacional do diretor Roberto Carminati, foi escolhido para abrir a 2ª edição do Hollywood Brazilian Film Festival, que aconteceu nos dias 04 a 07 de fevereiro desde ano, no Egyptian Theatre, em Hollywood Boulevard, estrategicamente localizado junto à calçada da fama. Roberto Carminati estudou cinema nos Estados Unidos e como dissertação de mestrado produziu o filme “A fronteira” que fala sobre as agruras dos imigrantes brasileiros procurando o “sonho americano” nas terras do Tio Sam. Com baixo orçamento quando comparado as grandes produções cinematográficas da franquia “007”, o filme não precisou ser “Democrata” para eleger o primeiro presidente negro do país, personificado pelo brilhante Milton Gonçalves. Na película não faltam políticos corruptos e a Diretora da Abin, Angela Vieira, faz inveja a todas “Bond Girl”. Como vilão a altura do mocinho, Carminati buscou o mesmo ator de “007 Quantum of Solace”, o veterano mexicano Joaquim Cóseo. Cinema, Inteligência e Espionagem formam uma tríade exitosa, nela a vida imita a arte e a arte imita a vida. Vejamos o exemplo do extinto e temido serviço de inteligência soviético – KGB, acrônimo em russo para Komitet Gosudarstveno Bezopasnosti (Comitê de Segurança do Estado), que determinava aos seus agentes operacionais do ocidente que assistissem a todos os filmes de James Bond, o agente secreto britânico fictício, criado pelo escritor Ian Fleming em 1953, mas que só foi levado às telas a partir de 1962, no auge da Guerra Fria. Das trevas da ignorância a respeito da Atividade de Inteligência ao Trezza da esperança, tenhamos todos a certeza de que haverá sempre ética, legalidade e controle sobre a Inteligência brasileira pelos Poderes Públicos constituídos, para que a sociedade enfim diga: Araponga, uma ova! Meu nome é Rocha, Marcos Rocha.

Fórum da Inteligência

Este é um espaço destinado ao debate e à manifestação democrática, livre, coerente e responsável de idéias sobre Inteligência.