domingo, 19 de junho de 2011

Quando a Justiça fortalece a democracia


[Editorial do jornal O Globo, publicado na edição deste domingo, 19 de junho de 2011.]
Houve quem pensasse, na fase da ditadura militar, que, com a redemocratização, os problemas do país seriam resolvidos quase que por gravidade. Não foi assim, e nunca seria, embora o resgate dos direitos civis, da liberdade no sentido amplo permitisse à sociedade se organizar em torno de um projeto de nação e debatê-lo constantemente, melhor forma de poder aperfeiçoá-lo. O próprio Estado de Direito democrático precisa ser fortalecido pelo exercício de prerrogativas fundamentais inscritas na Constituição. Não é tarefa simples num país que só a partir da penúltima década do século passado tem conseguido se manter por mais de duas décadas ininterruptas sem apagões institucionais. Esta construção perene da democracia reserva papel estratégico ao Poder Judiciário. Nele vão parar conflitos que permitem aos tribunais delimitar os espaços privados protegidos da ingerência do Estado, uma das essências da democracia. Nos regimes autoritários, o Estado, sob o controle de esquemas cesaristas, tripulado por salvadores da pátria, tende a eliminar a possibilidade do livre arbítrio. É preciso analisar neste contexto decisões recentes da Justiça, entendidas, de maneira equivocada, como de proteção a corruptos e criminosos de colarinho branco em geral.
Foram elas: a anulação de provas obtidas pela Polícia Federal na Operação Castelo de Areia, executada a partir de 2008 para investigar a participação de diretores da empreiteira Camargo Corrêa em operações de evasão de divisas e financiamentos ilegais de campanhas políticas; e idêntica decisão sobre outra operação da PF, a Satiagraha, cujas provas fundamentaram processo contra o banqueiro Daniel Dantas. Ambas decisões tomadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Nas duas investigações, agentes públicos usaram o poder de Estado para produzir provas sem respeitar ritos, normas, leis, direitos constitucionais dos investigados. No caso da Castelo de Areia, grampos telefônicos foram autorizados em instâncias iniciais da Justiça com base em denúncias anônimas. Como gravações telefônicas e vigilância eletrônica invadem de forma direta a privacidade, elas só podem ser liberadas de forma muito criteriosa. Não como aconteceu. A posição do STJ tem sua importância ampliada pelo fato de grampos, pela banalização, terem virado quase o único instrumento de investigação policial.
Na Satiagraha, conduzida pelo delegado Protógenes Queiroz — ele soube surfar a popularidade e ganhar um assento na Câmara dos Deputados pelo PCdoB de São Paulo —,houve uma articulação entre ele, um juiz então de primeira instância, Fausto De Sanctis, e o Ministério Público, numa espécie de cruzada contra Daniel Dantas, entre outros. Bem na filosofia dos "fins que justificam os meios", para processar e condenar investigados, o grupo chegou a contar com arapongas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), em ações clandestinas. A Satiagraha não poderia mesmo ser aceita em cortes superiores. Nos dois veredictos, a democracia saiu fortalecida. Não importam as folhas corridas e prontuários de investigados. Impossível é admitir no Estado de Direito tribunais de exceção, o uso da máquina do Estado para perseguir adversários, aberrações deste tipo. Mais ainda num país em que o Estado já tem uma presença opressiva sobre a sociedade. Os meios são tão importantes quanto os fins.

sábado, 18 de junho de 2011

As Forças Armadas brasileiras


Artigo de André Soares – 18/06/2011



"Si vis pacem, para bellum” é uma antiga e sábia expressão latina que significa “se queres a paz, prepara-te para a guerra" – porque ela sempre vem. Infelizmente, nossos governantes ao longo da nossa história se embriagaram com a estupidez de achar que o pacifismo e o não imperialismo nacionais imunizariam o Brasil contra as guerras, como se essa fosse uma decisão exclusivamente unilateral. Se por um lado o Brasil se orgulha de ser um país pacifista, de honrar os lemas “ordem e progresso” da sua bandeira nacional e de se tornar uma potência mundial, por outro lado se esquece que a soberania nacional tem um elevado custo e a história demonstra que o povo que não estiver disposto a lutar pela sua paz, não a merece.
Desde o término da guerra do Paraguai (1870), o destino nos tem proporcionado o usufruto de um período sem guerras, que estamos retribuindo com a ingratidão de lançarmos nossas Forças Armadas ao ostracismo operacional. Nesse interregno, tivemos na segunda guerra mundial um vergonhoso episódio do despreparo militar nacional, pois a participação da nossa Força Expedicionária Brasileira (FEB) naquele conflito armado foi salva exclusivamente pela bravura e heroísmo dos nossos pracinhas. Entretanto, se são eles os únicos brasileiros em mais de 100 anos que realmente combateram na guerra em defesa do país, hoje não recebem sequer a devida reverência da pátria amada.
Atualmente, sob o ponto de vista de emprego militar para a defesa nacional, as Forças Armadas brasileiras são não operacionais. Isto significa que são capazes de lutar, mas não de vencer, porque tropas operacionais são forjadas nas lides do emprego em combate e não dentro dos quartéis. Esse é o contexto das Forças Armadas brasileiras, cuja situação é idêntica ao cirurgião que nunca operou, ao engenheiro que nunca construiu, e pior, ao militar que nunca combateu, pois os nossos atuais comandantes militares, em suas longas carreiras profissionais, sequer viveram o “bom combate” como os nossos queridos e corajosos pracinhas, conquanto ostentem medalhas, muitas medalhas.
Inúmeros são os problemas desse quadro de falência múltipla como: destinação às Forças Armadas de ínfimos recursos orçamentários, majoritariamente empregados em despesas com pessoal e custeio; política nacional de defesa historicamente desencontrada e retórica; defasagem doutrinária de emprego militar; sucateamento do arsenal e indústria bélicos; crescente defasagem e dependência tecnológicas; obscuridade nos gastos com aquisição de equipamentos militares exclusivamente à mercê de critérios políticos e personalistas; deficiências de integração tático-operacional no emprego em conjunto dos elementos de combate das três Forças (Marinha Exército e Aeronáutica); desvio funcional e priorização de atividades subsidiárias em detrimento das operacionais; cultura de valorização da atividade-meio e esvaziamento da atividade-fim; poder militar nacional superdimensionado, estruturado exclusivamente em ilhas de excelência das Forças Armadas; grave evasão, notadamente dos quadros de oficiais; e fuga da carreira militar por parte dos jovens brasileiros promissores que, embora vocacionados, acertadamente não se submetem a uma vida indigna de baixos vencimentos.
Essa conjuntura de flagrante vulnerabilidade do poder militar do país, além de comprometer a soberania nacional, inviabiliza a pretensão internacional dos nossos governantes de levar o Brasil a conquistar assento no Conselho de Segurança da ONU, como membro permanente. Pura ingenuidade imaginar que o seleto grupo das maiores potências bélicas do mundo (China, França, Rússia, Reino Unido e EUA), aceitará o ingresso de um membro com poder militar não-operacional, como o Brasil.
A comemorar, apenas o patriotismo exacerbado dos militares brasileiros, submetidos aos imperativos de uma vida totalizante, de renúncia e dedicação exclusiva ao país, embora marcada por indesejáveis privações impostas à família militar. Portanto, há muito por fazer, a começar pela rediscussão do papel constitucional das Forças Armadas brasileiras e do assistencialista serviço militar obrigatório, pois guerras não são vencidas apenas com o patriotismo de bravos soldados, mas por Forças Armadas profissionais e operacionais.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Descriminalização e liberalização das drogas no Brasil

Artigo de André Soares – 16/06/2011

Você quer se matar? Então, se mate! É um direito seu. Fique à vontade para fazer o que bem entender da sua vida. Porque ela é toda sua. Contudo, o que você não tem direito é fazer apologia a que outras pessoas prejudiquem suas vidas, a exemplo de você. Nesse sentido, a descriminalização e liberalização das drogas são questões permanentes e polêmicas, embora não sejam complexas como se imagina. Todavia, a principal questão que você deveria investigar é o porquê do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, repentinamente, ter se tornado o “garoto-propaganda” de uma campanha em favor da descriminalização da maconha no Brasil, com tantas outras temáticas muito mais urgentes e relevantes para a conjuntura nacional, a serem encampadas por estadistas da estatura de ex-presidentes.
Quanto à problemática das drogas sejamos breves:
“Por que há drogas lícitas e ilícitas, em todo o mundo?” Ou seja, “por que algumas drogas podem e outras não podem, já que tanto drogas lícitas e ilícitas fazem mal à saúde?”
Simples:
Porque os estados não podem tudo. Aliás, os estados podem muito pouco. E uma das coisas que nenhum estado pode é conter a sociedade que o legitima. Portanto, as drogas ilícitas são as que o estado consegue proibir e as lícitas as que não consegue, simplesmente porque é impotente para fazê-lo.
Quanto ao repentino empenho pessoal do nosso ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em defesa da descriminalização da maconha no Brasil, com evidente estardalhaço na mídia nacional e internacional, o motivo é bem menos altruísta, porém politicamente obscuro.
Quer saber o porquê?
É o mesmo porquê que o ex-presidente Bill Clinton está fazendo a mesma campanha e o mesmo porquê que o quase ex-presidente All Gore está fazendo campanha semelhante pela salvação do meio ambiente.
O que está por trás de tudo isso?
Se você souber a verdade, provavelmente não irá acreditar.
Então, talvez seja melhor você fingir não estar sofrendo uma manipulação internacional e comemorar com sua família, seus amigos e a sociedade, a “doideira” da democracia brasileira, curtindo o “barato” da dominação, fumando seus “baseados” de maconha.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Mitos e verdades sobre a atividade de inteligência no Brasil


Artigo de André Soares
Pubicado no Jornal do Brasil - 15/06/2011

Muitas pessoas têm interesse pela denominada atividade de inteligência, influenciadas principalmente pelas histórias e filmes de espionagem. Particularmente no Brasil, há dificuldades intransponíveis em se obter informações fidedignas sobre esse ofício, em razão da desinformação produzida pelos órgãos oficiais. Significa não haver credibilidade nessas versões, razão pela qual a sociedade brasileira precisa conhecer a verdade sobre essa realidade, para o pleno exercício da cidadania e para que os brasileiros não comprometam suas vidas investindo nessa obscuridade, inadvertidamente.
Sobre a história da Inteligência de Estado no Brasil, o Serviço Nacional de Informações (SNI), criado em 1967, foi o único e breve suspiro auspicioso. Até degenerar-se e sucumbir. Sua sucedânea, a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), foi criada pela lei 9883, de 07 de dezembro de 1999, predestinada aos mesmos desígnios do SNI. Assim, seu inevitável destino conduziu o Brasil à maior e pior crise institucional de inteligência que vivenciamos na atualidade, desvelada em 2008 no festival de clandestinidades protagonizadas pela ABIN na Operação Satiagraha, recentemente condenadas em decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Financeiramente, a atividade de inteligência não é lucrativa em nenhum lugar do mundo. E qualquer notícia de empresa ou empresário milionário nesse ramo, certamente não será o que parece. O ingresso em serviços de inteligência no Brasil pode ser realizado na ABIN, por concurso público; ou nas instituições públicas mais tradicionais, por indicação política. No segundo caso, é importante ressaltar que há raras estruturas de inteligência eficientes no país e as melhores estão nas forças armadas.
Contudo, a principal motivação por essa atividade é o desejo de ser agente secreto. Nesse mister, a boa notícia é que agentes secretos existem de fato. A má é que o Brasil não os possui em seus serviços de inteligência. Essa é perfídia plantada no seio da sociedade, enganando muitos jovens brasileiros, homens e mulheres, incitados ao concurso público para ingresso na ABIN, esperançosos de viver uma carreira profissional de agentes secretos. Portanto, a melhor garantia e possibilidade que há em integrar os quadros de serviços de inteligência no Brasil é a de se tornar um excelente servidor público burocrata.
Enfatiza-se que a atividade de inteligência não é profissão reconhecida oficialmente no país, estando muito aquém de alcançar o mérito dessa condição. Porque, principalmente, não há arcabouço de expertise própria consolidada e validada cientificamente no Brasil, cujo diletantismo com que é exercida é uma das causas da atual crise nacional.
Não por acaso, a verdade que nossos governantes não revelam é que os conhecimentos provenientes da inteligência nacional são majoritariamente de baixa credibilidade. Essa situação é agravada pela sua desorientação e falta de identidade, produzindo informações de mesma natureza e em duplicidade com as instituições legitimamente competentes, em sobreposição e interferência indevidas.
Tal impropriedade decorre do grave atentado contra o estado, cometido por nossas autoridades públicas, contrariando a verdade inconteste que a atividade-fim da Inteligência de Estado é expertise operacional do sigilo. Esta é atividade afeta à ação e emprego dos agentes secretos, constituindo-se na única razão de ser e existir dos serviços de inteligência, em todo o mundo. Infelizmente, o que há no país é uma legião de arapongas e agentes clandestinos, os quais são muitas vezes forjados em nossas organizações de inteligência.
A gravidade da conjuntura atual é ainda mais alarmante porque como a ABIN é o órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN) sua ascendência e influência sobre as demais estruturas de inteligência nacionais são inescapáveis, generalizando a ineficiência institucional dessa atividade. Ressalta-se o total descontrole do estado brasileiro sobre a atuação dos órgãos de inteligência nacionais, os quais constituem uma "caixa-preta" invencível, dominada pela obscura e autofágica “comunidade de inteligência”, cuja fúria nossos governantes temem desafiar. O cenário prospectivo é pessimista porque o Brasil não possui há décadas uma Política Nacional de Inteligência e as autoridades nacionais demonstram sobejamente a incapacidade de salvar o país desse lamentável estado de coisas a que chegou a Inteligência de Estado nacional.

Sigilo eterno é inconstitucional, diz Gurgel

Folha de São Paulo

Procurador-geral indica que recorrerá ao STF caso o Senado mantenha o segredo sobre documentos históricos
Chefe do Ministério Público promete tomar "todas as providências" para garantir a abertura dos arquivos secretos
BERNARDO MELLO FRANCO

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, indicou ontem que recorrerá ao STF (Supremo Tribunal Federal) caso o Senado mantenha o sigilo eterno sobre documentos oficiais.
Ele afirmou que qualquer barreira contra o direito à informação pública é inconstitucional e disse não ver motivo para que papéis históricos permaneçam em segredo.
"O direito à verdade é um direito fundamental. Qualquer iniciativa que busque afastá-lo tem deficit de constitucionalidade", afirmou.
"O Ministério Público vai fazer tudo para assegurar que o direito à verdade seja plenamente exercido. Tomaremos todas as providências para que isso seja efetivado."
Gurgel informou que vai esperar que o Senado vote o projeto sobre a reclassificação dos papéis oficiais para decidir se recorre ao STF.
Ele ressaltou que o projeto aprovado na Câmara, que limita o sigilo sobre os documentos considerados ultrassecretos a 50 anos, não prejudica ações do governo ou da diplomacia brasileira.
O ex-ministro Paulo Vannuchi (Direitos Humanos) afirmou que o sigilo eterno é inconstitucional e que um eventual recuo na abertura dos papéis seria "uma vergonha para o Parlamento".
"É inaceitável. Não tem o menor cabimento manter em sigilo documentos da Guerra do Paraguai ou do tempo do Barão do Rio Branco", disse.
Ele criticou o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), que pressiona o Planalto contra a abertura indiscriminada dos arquivos.
"É marca do passado ditatorial de pessoas que não conseguiram fazer a transição para a democracia."
Ontem, o Ministério Público promoveu ato em São Paulo para comemorar a repatriação dos arquivos do projeto "Brasil Nunca Mais", que estavam nos EUA desde o fim da ditadura militar.
O acervo reúne depoimentos de ex-presos políticos e identifica agentes que praticavam tortura. As informações serão digitalizadas e devem ser usadas pela futura Comissão da Verdade para investigar crimes cometidos durante o regime.

Governo demite araponga suspeito

Cláudio Humberto
 
Ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o general José Elito Carvalho Siqueira julgou "culpado" Jarbas Marcílio Leventi, oficial de Inteligência da Abin, órgão de arapongagem do governo, e o demitiu "por valer-se do cargo para lograr proveito pessoal". O dinheiro afanado era público, mas o ministro alegou a "natureza reservada" do caso para silenciar. Mandou dizer que isso interessa apenas às partes envolvidas.

Público e privado O araponga é natural de Mato Grosso, andou gastando demais em Brasília e é acusado de misturar dinheiro pessoal com o de serviço.

Ruim a gente esconde O general José Elito mantém sigilo sobre o caso do araponga demitido dizendo atender a uma orientação da Controladoria-Geral da União.

Lorota do GSI A CGU informou que processos administrativos disciplinares são reservados apenas em sua fase de instrução, até o julgamento.

terça-feira, 14 de junho de 2011

A Abin e a Satiagraha

Artigo de André Soares - 14/06/2011



A recente condenação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o festival de clandestinidades protagonizadas e acobertadas pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), na Operação “Satiagraha”, em 2008, onde atuaram uma centena de seus agentes, levando o então presidente Lula a afastar imediatamente o seu Diretor-Geral, Paulo Lacerda, e toda a cúpula da ABIN, desvelando a maior e pior crise institucional de inteligência de nossa história; revela não apenas a gravidade da ilegalidade das ações cometidas pela ABIN contra o próprio estado brasileiro, o qual deveria defender, como principalmente o seu preocupante desvirtuamento ético-moral. Porque, não bastasse a condenação judicial do estado contra a sua atuação vergonhosa e abjeta, verifica-se que recrudesce em setores da ABIN o vigor dessa mentalidade deturpada, deformada e criminosa.
O que deve fazer um integrante de serviço de inteligência que toma conhecimento de irregularidades e crimes que estão sendo cometidos internamente pelos dirigentes desse serviço contra a sociedade e o estado; e que estão sendo acobertados sob o manto do sigilo legal?
Pois, mais de uma centena de integrantes da ABIN, que viveram esse desvirtuamento na Operação Satiagraha nada fizeram. Ao contrário, as apurações da 'Satiagraha' expuseram à sociedade as ações praticadas pelos agentes da Abin, que durante meses agiram clandestinamente; em promiscuidade com ex-agentes; sem controle; ferindo de morte a doutrina de inteligência; à revelia da legalidade; a serviço de interesses personalistas e escusos; atentando contra o próprio Estado; e confiantes na mais completa impunidade, certos de se esconderem sob o manto do sigilo institucional. Não fosse o acaso de terem sido descobertos, sabe-se lá que prejuízos mais teriam sido causados ao país; pois, dentre todos esses homens e mulheres da ABIN, não houve sequer um(a) honrado(a) e corajoso(a) cidadão(ã) a denunciar esse estado de coisas. Mais estarrecedor é que quando chamados à responsabilidade nas investigações da PF e da CPI seus dirigentes mentiram à nação brasileira, a começar pelo dirigente máximo da ABIN.
Essa não é uma questão afeta meramente à consciência pessoal e de foro íntimo. Não há nem mesmo qualquer dilema a ser analisado, que supostamente justificaria um conflito de ordem filosófica. Essa é uma questão extremamente simples e objetiva, pois trata-se unicamente do respeito à legalidade, ao Estado democrático de Direito desse país e, principalmente, do cumprimento da nossa Constituição Federal, aos quais todos os brasileiros e brasileiras estão obrigados por dever de cidadania.
O que deve fazer um operador de inteligência nessas circunstâncias? A resposta já foi há muito proferida nas sábias palavras do coronel Walther Nicolai, chefe do serviço de inteligência do chanceler Bismarck, que declarou:
"A Inteligência é um apanágio dos nobres; confiada a outros, desmorona".
Sempre desmorona, pois somente os dotados de inabalável fortaleza ética e moral, cujo perfil se caracteriza sobretudo pelo exemplo, são dignos para o exercício da Inteligência.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Maus presságios para o Brasil

Artigo de André Soares - 13/06/2011

Ela não está feliz

Que ela não está feliz é mais que evidente.

Não se trata de uma constatação episódica, mas permanente. Principalmente, porque ela não está feliz, quando mais deveria estar. Pois, ela está vivendo a vitória pessoal de toda a sua vida, conquistada com muito sangue derramado em décadas de luta política no Brasil.

E isso é preocupante porque significa que algo não vai bem com ela.

E se algo não vai bem com ela, significa que é ruim também para o Brasil.

Passar o Brasil a limpo

Artigo de André Soares - 13/06/2011

As recentes declarações dos ex presidentes Sarney e Fernando Collor favoráveis à manutenção do sigilo eterno relativo a determinados documentos históricos, sob o pretexto de que sua publicidade poderia "abrir feridas" do nosso passado é um atentado à democracia do país.

"Um povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la" é sabedoria consagrada e um país democrático não pode desconhecer seu próprio passado. A relutância de nossos governantes é indicativo significativo de que o Brasil precisa ser passado a limpo. E isso deve ser feito com toda a publicidade e transparência. Doa a quem doer.

 

Dilma cede a pressões e agora quer manter sigilo eterno de documentos

Estado de São Paulo 13/06/2011
 
 

Ideli Salvatti, nova ministra de Relações Institucionais, disse ao "Estado" que governo vai atender a reivindicações dos senadores e ex-presidentes José Sarney (PMDB-AP) e Fernando Collor (PTB-AL) para facilitar tramitação do projeto no Senado
Eduardo Bresciani - O Estado de S.Paulo

A presidente Dilma Rousseff vai patrocinar no Senado uma mudança no projeto que trata do acesso a informações públicas para manter a possibilidade de sigilo eterno para documentos oficiais. Segundo a nova ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, o governo vai se posicionar assim para atender a uma reivindicação dos ex-presidentes Fernando Collor (PTB-AL) e José Sarney (PMDB-AP), integrantes da base governista.
A discussão sobre documentos sigilosos tem como base um projeto enviado ao Congresso pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009. No ano passado, a Câmara aprovou o texto com uma mudança substancial: limitava a uma única vez a possibilidade de renovação do prazo de sigilo. Com isso, documentos classificados como ultrassecretos seriam divulgados em no máximo 50 anos. É essa limitação que se pretende derrubar agora.
"O que gera reações é uma emenda que foi incluída pela Câmara. Vamos recompor o projeto original porque nele não há nenhum ruído, nenhuma reação negativa", disse Ideli ao Estado.
Acatar a mudança defendida pelos ex-presidentes é a forma encontrada para resolver o tema, debatido com frequência no Senado desde o início do ano. O governo cogitou fazer um evento para marcar o fim do sigilo eterno - Dilma sancionaria a lei em 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.
Temerário. O desfecho não foi assim por resistência de Collor. Presidente da Comissão de Relações Exteriores, ele decidiu relatar a proposta e não deu encaminhamento ao tema. No dia 3 de maio, o ex-presidente foi ao plenário e mandou seu recado ao Planalto ao classificar de "temerário" aprovar o texto como estava. "Seria a inversão do processo de construção democrática."
Desde então, a votação vem sendo adiada repetidas vezes. Na semana passada, Dilma almoçou com a bancada do PTB no Senado. Na ocasião, Collor teria manifestado sua preocupação sobre o tema e exposto argumentos contrários ao fim do sigilo.
O senador Walter Pinheiro (PT-BA), que relatou o projeto na Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicação e é contra o sigilo eterno, vai procurar Ideli nesta semana para tratar do tema. "Estamos propondo acesso a informação de fatos históricos. Você vai abrir comissão da verdade para discutir o período da ditadura e não pode ter acesso às verdades históricas no Brasil?"
Atualmente, documentos classificados como ultrassecretos têm sigilo de 30 anos, mas esse prazo pode ser renovado por tempo indeterminado, o que ocorreu nos governos Lula e Fernando Henrique Cardoso.
Documentos da Guerra do Paraguai, terminada há 141 anos, continuam secretos até hoje. Se a nova lei for aprovada da forma como deseja agora Dilma, a única diferença é que a renovação do sigilo se daria a cada 25 anos.

Historiadores criticam recuo da presidente

 
 

Estado de São Paulo 13/06/2011

Daniel Bramatti - O Estado de S.Paulo

O fato de a presidente Dilma Rousseff ter cedido às pressões dos defensores do sigilo eterno de documentos ultrassecretos foi considerado "lamentável" pelo historiador Carlos Fico, militante pela abertura dos arquivos da ditadura militar.
Marco Antonio Villa, também historiador, afirmou que a decisão criará mais um entrave para que os cidadãos possam refletir sobre a história recente do País.
"É lamentável que o governo recue com o projeto de lei pronto para ir à votação no Senado", destacou Fernando Oliveira Paulino, um dos coordenadores do Fórum do Direito de Acesso a Informações Públicas.
Para Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o principal responsável pelo recuo de Dilma é o Ministério das Relações Exteriores, que teme passar por constrangimentos diplomáticos caso venham a público registros históricos brasileiros sobre questões que envolvem países vizinhos.
"Se a informação se confirmar, será um retrocesso não apenas do ponto de vista político, mas também da própria palavra da presidente", afirmou Fico, referindo-se ao fato de Dilma já ter orientado sua base a aprovar o projeto com um limite de 50 anos de sigilo para os papéis ultrassecretos.
Sem comparação. "Assim não conseguiremos ter acesso a fontes primárias para escrever a história contemporânea do Brasil", observou Villa, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). "Não conheço nenhum país democrático com legislação tão rigorosa quanto a brasileira em relação ao sigilo de documentos."
O historiador creditou o recuo de Dilma às pressões dos ex-presidentes Fernando Collor e José Sarney, ambos senadores e contrários ao fim do sigilo eterno. "Eles temem a divulgação de documentos com informações sobre seus próprios governos", apontou Villa. "A decisão mostra que a presidente continua refém de uma base governista movida por interesses nada republicanos."
O projeto que trata do sigilo de documentos também estabelece regras para que o governo responda a pedidos de informações feitos por cidadãos e empresas. Se ele for alterado no Senado, como agora admite o Palácio do Planalto, terá de voltar à Câmara dos Deputados para uma segunda votação na Casa. Com isso, seria inviabilizada sua entrada em vigor em um prazo curto.
"A aprovação do projeto pode proporcionar transparência na relação do Estado com a sociedade, evitando situações de corrupção e facilitando investimentos de empresas nacionais e internacionais", disse Paulino. Para ele, o recuo de Dilma "trará prejuízos à cidadania e à economia brasileira".

Satiagraha anulada

 
 

Folha de São Paulo 13/06/2011 - Editoriais
STJ defende com firmeza os direitos individuais e anula provas da operação policial; falta disciplinar meios para chegar à verdade e a punições

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu anular as provas produzidas pela Operação Satiagraha (algo como "firmeza na verdade", em sânscrito). Em 2008, essa mobilização da Polícia Federal havia resultado na prisão preventiva de várias personalidades do mundo político e financeiro no país, como o banqueiro Daniel Dantas.
Para o ministro Jorge Mussi, presidente da quinta turma do STJ, a forma como se deu a cooperação entre a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e a Polícia Federal (PF), no caso, "representa um modelo de apuração próprio de polícia secreta, à margem das mais comezinhas regras do Estado democrático de Direito".
Chama atenção o fato de ser essa a segunda oportunidade, em dois meses, em que uma grande operação da PF termina anulada na Justiça. Em abril, o mesmo STJ tinha anulado as provas da Operação Castelo de Areia, a maior já realizada para investigar financiamento ilegal de campanhas eleitorais. Nesse caso, a corte rejeitou as provas porque as escutas telefônicas foram autorizadas só com base em denúncias anônimas.
É sem dúvida saudável que os tribunais superiores exerçam o papel de controle das garantias individuais na condução de investigações. Trata-se de uma das atribuições mais nobres e elevadas do Judiciário, e quem tem memória mais longa se lembrará sem esforço de tempos em que os direitos dos cidadãos não contavam com o mesmo grau de amparo. Por outro lado, é indesejável que tal engajamento acabe por amplificar a sensação de impunidade que se generaliza na sociedade.
Não é simples traçar a fronteira entre um Estado policial que investiga a qualquer custo e uma proteção de direitos que implique travar a responsabilização de criminosos. Mas o que temos no Brasil é, de certo modo, o pior de dois mundos: investigações que violam os direitos fundamentais e, não obstante, impunidade em decorrência desses mesmos abusos, após sua justa invalidação.
É fato que técnicas novas de investigação se desenvolveram muito nos últimos anos. A capacidade de fazer escutas telefônicas e ambientais em larga escala e os softwares que relacionam enormes massas de dados são exemplos de como a tecnologia pode expandir a capacidade investigativa da polícia, mas o emprego dessas técnicas muitas vezes viola a privacidade dos cidadãos.
As decisões dos tribunais superiores não podem ser vistas como empecilho à nova maneira de investigar. Elas precisam induzir uma onda de reformas modernizantes no processo penal, que possibilite usar técnicas eficazes sem atropelar direitos individuais.

domingo, 12 de junho de 2011

O amor II - a 'guerra'



Artigo de André Soares - 21/08/2010 

Quem sabe ‘o que é o amor’ e o conhece verdadeiramente sabe também que:

Amar é sofrer – inescapavelmente.

Amar é tangenciar o limiar da morte, pois quem ama, ama com a própria vida.

É por isso que não existe força maior que o amor.

Quem ama tem poder – o maior poder.

Amar implica se arriscar, correr riscos e principalmente lutar a ‘guerra’ de viver a vida, verdadeiramente.

Todavia, toda guerra sempre tem elevado custo para seus contendores, especialmente em mortos e feridos.

É por isso que ‘amar é sofrer’, pois não há guerra de cujo combate se saia incólume.

Portanto, o maior risco da ‘guerra’ do amor é que se pode ‘morrer de amor’, literalmente.

Sorte no amor é sobreviver. Mas, tem um ônus - sempre ferido, ou muito ferido.


A maioria das pessoas certamente achará que tudo isso é puro exagero.

É por isso que a imensa maioria das pessoas não ama. O máximo que as pessoas conseguem é fingir - brincar de amor.

Quer ver?

Então responda:

Você acha que todos aqueles que juram solenemente amor à pátria a amam, verdadeiramente?

Você acha que todos aqueles que juram solenemente amor aos seus amores, os amam, verdadeiramente?

Se você acha que sim é porque nunca combateu na guerra, nem em defesa da pátria, nem na luta do amor.

Mas você não precisa ir à guerra para descobrir isso. Aliás, a guerra é sempre muito perigosa e, como foi dito, você pode se ferir, ou morrer.

Basta olhar à sua volta e observar os relacionamentos e as vidas da esmagadora maioria dos que dizem amar.

Observe, por exemplo, os casais.

O que se vê?

Por trás de intempestivos, rotineiros, ou eventuais, beijos, abraços, carícias e sexo, o que existe de fato é uma vida morna, sem calor, sem fogo, sem emoção, sem tesão....e sem propósito. Tudo isso está estampado no olhar apagado e sem vida desses que dizem amar.

Isso é amor?

Quanto ao amor pelo ‘bom combate’ de lutar pela pátria, infelizmente você não terá como verificar à sua volta. Mas, nessa guerra, a decepção é muito maior. Acredite. 


E o que dizer do decantado amor romântico?

Ele realmente existe?

Homens e mulheres sabem amar?

Homens e mulheres amam do mesmo jeito?

Pode-se confiar no amor?


O amor é uma ‘guerra’ para a qual há que se ter coragem - muita coragem.

Mas, cuidado!

Não basta a coragem.

É preciso também inteligência – muita inteligência.

Pois a ‘guerra’ do amor é repleta de emboscadas, armadilhas e traições.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Ética & Verdade

Artigo de André Soares

 

"Você sabe o que é Ética?"

"Se souber, aceita um convite?"

Convite:

"Responda o que é Ética".

Apesar de você achar que sabe o que é Ética, sentirá uma singular dificuldade para conseguir explicá-la.

"Conseguiu responder?"

"Tem certeza sobre o que disse?"

"Quer tentar de novo?"

Agora que conseguiu responder, vem a pergunta mais importante:

"A sua resposta está correta?"

"Tem certeza?"

"Vamos investigar?"

O que pode estar parecendo ser uma brincadeira, não é.

Faça, você, estes questionamentos às pessoas e tome cuidado porque elas vão se aborrecer, e muito!

"Sabe por que?"

Porque é próprio do ser humano se aborrecer quando se vê forçado a se deparar com a própria ignorância.

É exatamente por isso que a Ética sempre foi assunto permanente e recorrente na história da humanidade - e continuará sendo.

O fato dessa temática estar atualmente ocupando cada vez mais espaço na agenda internacional, vem revelar aspectos ainda mais inquietantes sobre essa questão, demonstrando, por exemplo, que:

  • A degenerescência dos valores ético-morais das sociedades é a gênese do crescente recrudescimento de graves problemas político-sociais que ameaçam a estabilidade institucional dos países, a exemplo da corrupção no Brasil.
  • O grande esforço informacional que se está empreendendo em favor da Ética não é correspondido na mesma proporção em resultados práticos.
  • A despeito do absoluto consenso existente sobre a importância do comportamento ético há, especialmente nas sociedades mais vulneráveis, um abismo paradoxal e hipócrita de oposição entre esse discurso e a realidade.

Alcançar a expertise da Ética implica Inteligência Operacional, e esta é apanágio dos nobres.

terça-feira, 7 de junho de 2011

STJ considera irregular ação da Abin e anula ação contra Daniel Dantas


Valor Online


BRASÍLIA - Por três votos a dois a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus ao dono do banco Opportunity, Daniel Dantas, e anulou a ação penal que tramitava contra ele em São Paulo. A maioria dos ministros considerou irregular a participação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), nas investigações feitas no âmbito da Operação Satiagraha - deflagrada pela Polícia Federal em 2008 para apurar crimes financeiros supostamente cometidos pelo banqueiro.
"A ação penal foi anulada e as provas que a embasaram também", afirmou o advogado de Dantas, Andrei Schmidt. "Vamos recorrer para anular outras ações envolvendo essa operação." Segundo ele, após a reunião de hoje do STJ, não "sobra pedra sobre pedra" na operação Satiagraha.
O ministro do STJ Jorge Mussi, autor do voto de desempate, concluiu que a ajuda da Abin nas investigações feitas pelo delegado Protógenes Queiroz na Satiagraha foi "informal e clandestina".
(Juliano Basile | Valor)

O pior cego é aquele que não quer ver.


Artigo de André Soares - 07/06/2011

A atitude do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, arquivando os pedidos de investigação contra o ministro Antonio Palocci (Casa Civil) e sua consultoria, argumentando não ter visto indícios dos crimes é decepcionante e temerária.
Decepcionante porque demonstra inequivocamente a vulnerabilidade institucional do MP, pela sua total incapacidade investigativa. Ou, o Sr procurador-geral imaginava que receberia uma declaração de culpa nos documentos encaminhados pelo Sr Palocci? Porque se o MP quiser encontrar os referidos indícios, não os encontrará em ofícios de encaminhamento, nem sentado em seus gabinetes.
Temerária porque o pior cego é aquele que não quer ver.



sexta-feira, 3 de junho de 2011

Mensagem aos jovens – Mitos e verdades sobre a atividade de inteligência


Artigo de André Soares - 02/06/2011


Se você tem interesse pela denominada atividade de inteligência e pensa em exercê-la, certamente encontrará dificuldades intransponíveis em obter informações fidedignas sobre esse ofício. Particularmente no Brasil, você será alvo da desinformação dos órgãos oficiais, o que significa que tudo aquilo que ouvir não será exatamente o que irá encontrar. Essa é a razão pela qual os jovens brasileiros precisam conhecer a verdade sobre a realidade da atividade de inteligência, a fim de não comprometerem seriamente o futuro de suas vidas investindo em algo obscuro e que, inadvertidamente, pode ser muito perigoso.
“Não imaginei que havia criado um monstro” foram palavras proferidas pelo arrependido General Goubery do Couto e Silva, referindo-se ao extinto Serviço Nacional de Informações (SNI), criado em 1967, do qual foi um dos principais idealizadores. Sobre a história da Inteligência de Estado no Brasil, o SNI foi o único e breve suspiro auspicioso dessa atividade no país. Até degenerar-se e sucumbir. Sua sucedânea, a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), foi criada em 1999 predestinada aos mesmos desígnios do SNI. Assim, seu destino inevitável conduziu o Brasil à maior e pior crise institucional de inteligência que vivenciamos na atualidade, desvelada em 2008 no festival de clandestinidades protagonizadas pela ABIN na Operação Satiagraha.
A conjuntura atual é ainda mais alarmante porque como a ABIN é o órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN) sua ascendência e influência sobre as demais estruturas de inteligência nacionais são inescapáveis, generalizando a ineficiência institucional dessa atividade no país. Ressalta-se o total descontrole do estado brasileiro sobre a atuação dos órgãos de inteligência nacionais, os quais constituem uma “caixa-preta” invencível, cuja fúria nossos governantes temem desafiar. Todavia, o cenário vindouro é por demais pessimista porque o Brasil não possui há décadas uma Política Nacional de Inteligência e as autoridades nacionais demonstram sobejamente a incapacidade de salvar o país desse lamentável estado de coisas a que chegou a Inteligência de Estado nacional.
Você ainda tem interesse pela atividade de inteligência no Brasil?
Tem certeza?
Porque, se tiver, é importante saber mais.
E a primeira pergunta a responder é:
 “O que você quer?”
Pois, se você quiser ganhar dinheiro, desista. A atividade de inteligência não é lucrativa, em nenhum lugar do mundo. Muito menos no setor privado.
Você tem notícia de alguma empresa ou empresário milionário da atividade de inteligência? Se tiver, certamente está enganado porque, nesse ramo, “nada é o que parece”.
Por outro lado, se o que você quer é integrar serviços de inteligência no Brasil, então poderá fazê-lo ingressando na ABIN, por concurso público; ou nas instituições públicas mais tradicionais, por indicação política. Nesse segundo caso, é importante saber que há algumas raras estruturas de inteligência no país eficientes e, inclusive, de excelência. E as melhores estão nas forças armadas.
Agora, se você pretende ser agente secreto o caminho é completamente diferente. Porque (que ninguém nos ouça), mas a verdade proibida de ser revelada e que ninguém sabe (mas ninguém mesmo, nem os governantes sabem) é que o Brasil não possui agentes secretos em seus serviços de inteligência (esse segredo fica só entre nós...qualquer problema, eu nego tudo...).
Portanto, na realidade, a melhor garantia que há em integrar os quadros de serviços de inteligência no país é a de se tornar um excelente servidor público burocrata.
Por que?
Porque agentes secretos existem; mas, estes, “desacontecem”.
Você ainda tem certeza que quer ser agente secreto?
Porque, apesar do que possa parecer, isso é plenamente possível no Brasil, como em qualquer lugar do mundo.
Porque se tiver vontade, a próxima pergunta a responder é:
 “Quem você é?”
Porque qualquer pessoa pode ser funcionário público, mas não agente secreto. Estes são pessoas especialíssimas e raras, em todos os sentidos. Desta forma, há apenas dois únicos requisitos para ser agente secreto, que evidentemente não é passar em concurso público, ou ser indicado politicamente. Esses requisitos na verdade são uma excelente notícia para aqueles que têm essa pretensão porque ser agente secreto depende única e exclusivamente de si mesmo. Nada mais.
Quais são eles?
O primeiro requisito é possuir o devido perfil. E o perfil do verdadeiro e autêntico agente secreto incorpora integralmente todos os atributos e qualidades do personagem “007- James Bond”, bem como de suas parceiras agentes secretas; pois vale lembrar que as mulheres estão incluídas nesse seleto universo e também são esplendorosas.
Contudo, essa é outra verdade proibida porque serviços de inteligência, especialmente no Brasil, vendem a falsa idéia de que o perfil dos agentes secretos é o de pessoas comuns, desprovidas de dotes e atributos excepcionais, cuja mediocridade os fazem passar despercebidamente. Essa é desinformação produzida para mascarar a inoperância desses órgãos.
Outra mentira ardilosa sobre agentes secretos é a de que eles são forjados nos serviços de inteligência. Tal perfídia, plantada no seio da sociedade, tem enganado e iludido muitos jovens brasileiros, homens e mulheres, incitados ao concurso público para ingresso na ABIN, esperançosos de que irão construir e viver uma carreira profissional de agentes secretos. Porém, infelizmente, o que há no país é uma legião de arapongas e agentes clandestinos, os quais são muitas vezes forjados nessas organizações, pelo diletantismo irresponsável que nelas impera.
Contudo, lembremos que além do perfil ainda há o último requisito para ser agente secreto.
Porém, antes de conhecê-lo, é muito importante reaprender com a própria história nacional a verdade inconteste conhecida desde Sun Tzu, que serviços de inteligência são verdadeiros monstros, na pior acepção da palavra. Só havendo uma única excepcionalidade. Essa é outra verdade proibida de ser dita no Brasil, mas que já foi escancarada ao mundo pelo Coronel Walther Nicolai - 1873/1934 - Chefe do Serviço de Inteligência do Chanceler Bismarck, que disse:
“A Inteligência é um apanágio dos nobres. Confiada a outros, desmorona".
Sempre desmorona. Nunca se esqueça disso. Não, se quiser ser agente secreto.
Isso porque serviços de inteligência que se esquecem disso se tornam monstruosidades de corrupção. E a maioria é assim. Por isso, na atividade de inteligência só há dois tipos de profissionais: os corruptos e os que “vão prá guerra”. E a maioria não “vai prá guerra”
Também, nunca se esqueça disso. Porque será mera questão de tempo para serviços de inteligência corruptos te vitimarem. E nada, nem ninguém, fará qualquer coisa por você, que será abandonado, cairá em desgraça, ou morrerá.
Portanto, ainda tem certeza que você quer ser agente secreto?
Porque, se tiver, o último requisito é ter que tomar uma decisão de vida muito difícil e dolorosa, com um ônus altíssimo para você e para os seus entes queridos.
E é nesse ponto de inflexão que a maioria das pouquíssimas pessoas que possuem o perfil para agente secreto desiste.
Agentes secretos têm de tomar a decisão de viver, por toda a vida, completamente só, sem família, sem amigos, e em local desconhecido.
Evidentemente, que todo esse sacrifício tem uma contrapartida mais que compensadora. Pelo menos, assim pensam os agentes secretos.
Mas, você não precisa ser um deles.
Afinal, a esmagadora maioria dos que atuam na atividade de inteligência prefere a mediocridade de ser no máximo um excelente servidor público burocrata.

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