terça-feira, 14 de junho de 2011

A Abin e a Satiagraha

Artigo de André Soares - 14/06/2011



A recente condenação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o festival de clandestinidades protagonizadas e acobertadas pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), na Operação “Satiagraha”, em 2008, onde atuaram uma centena de seus agentes, levando o então presidente Lula a afastar imediatamente o seu Diretor-Geral, Paulo Lacerda, e toda a cúpula da ABIN, desvelando a maior e pior crise institucional de inteligência de nossa história; revela não apenas a gravidade da ilegalidade das ações cometidas pela ABIN contra o próprio estado brasileiro, o qual deveria defender, como principalmente o seu preocupante desvirtuamento ético-moral. Porque, não bastasse a condenação judicial do estado contra a sua atuação vergonhosa e abjeta, verifica-se que recrudesce em setores da ABIN o vigor dessa mentalidade deturpada, deformada e criminosa.
O que deve fazer um integrante de serviço de inteligência que toma conhecimento de irregularidades e crimes que estão sendo cometidos internamente pelos dirigentes desse serviço contra a sociedade e o estado; e que estão sendo acobertados sob o manto do sigilo legal?
Pois, mais de uma centena de integrantes da ABIN, que viveram esse desvirtuamento na Operação Satiagraha nada fizeram. Ao contrário, as apurações da 'Satiagraha' expuseram à sociedade as ações praticadas pelos agentes da Abin, que durante meses agiram clandestinamente; em promiscuidade com ex-agentes; sem controle; ferindo de morte a doutrina de inteligência; à revelia da legalidade; a serviço de interesses personalistas e escusos; atentando contra o próprio Estado; e confiantes na mais completa impunidade, certos de se esconderem sob o manto do sigilo institucional. Não fosse o acaso de terem sido descobertos, sabe-se lá que prejuízos mais teriam sido causados ao país; pois, dentre todos esses homens e mulheres da ABIN, não houve sequer um(a) honrado(a) e corajoso(a) cidadão(ã) a denunciar esse estado de coisas. Mais estarrecedor é que quando chamados à responsabilidade nas investigações da PF e da CPI seus dirigentes mentiram à nação brasileira, a começar pelo dirigente máximo da ABIN.
Essa não é uma questão afeta meramente à consciência pessoal e de foro íntimo. Não há nem mesmo qualquer dilema a ser analisado, que supostamente justificaria um conflito de ordem filosófica. Essa é uma questão extremamente simples e objetiva, pois trata-se unicamente do respeito à legalidade, ao Estado democrático de Direito desse país e, principalmente, do cumprimento da nossa Constituição Federal, aos quais todos os brasileiros e brasileiras estão obrigados por dever de cidadania.
O que deve fazer um operador de inteligência nessas circunstâncias? A resposta já foi há muito proferida nas sábias palavras do coronel Walther Nicolai, chefe do serviço de inteligência do chanceler Bismarck, que declarou:
"A Inteligência é um apanágio dos nobres; confiada a outros, desmorona".
Sempre desmorona, pois somente os dotados de inabalável fortaleza ética e moral, cujo perfil se caracteriza sobretudo pelo exemplo, são dignos para o exercício da Inteligência.

Um comentário:

  1. Acredito que talvez, tendo como ponto de vista a opinião de um leigo, o que falta uma reorganização e definição das atribuições legais e constitucionais da ABIN. Não vejo o fato ocorrido, durante a operação Satiagraha, como algo "tão" criminoso como está sendo intitulado. Podem existir algumas prerrogativas e embasamentos legais onde tal ação, tendo em vista interesse do Estado e da sociedade, não afirmando que foi o caso específico, que justifiquem a atuação e participação de agentes na operação. Não é algo tão inimaginável e difícil de acontecer, a colaboração de agencias e órgãos governamentais. O que é necessário acontecer, seria uma definição sobre isso, o que julgo não existir.
    O que a nação precisa é de serviços de inteligencia que sejam eficientes e atuem de forma concreta, precisa e eficiente, apoiando e protegendo os interesses do Brasil.
    Antecipadamente, peço desculpas por algum equívoco que posso ter cometido ao emitir minha opinião.

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