Artigo de André Soares - 25/05/2018
Como estruturar um sistema de
inteligência é uma das mais cruciais, estratégicas e prioritárias
questões de estado, em todo o mundo; que, no Brasil, tem conduzido o
país ao suicídio. Isso porque, tomados por estado de completa ignorância
nesse mister, presidentes da república, parlamentares, comandantes,
diretores e gestores institucionais, em todo o país, vem cometendo o
suicídio pátrio de replicar nas instituições nacionais as mesmas
práticas deletérias da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), que é o
órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN);
desconsiderando porém que a agência é escabrosamente ineficiente e
disfuncional. Evidentemente que o resultado final no âmbito estatal é
igualmente desastroso; e por vezes igualmente criminoso.
Como frisei no artigo
anterior, qualquer animal irracional já teria descoberto empiricamente,
ao longo de quase 20 anos de criação da ABIN, que a agência conduz a
Inteligência de Estado no Brasil em direção diametralmente oposta ao
preceito constitucional da eficiência, previsto no artigo 37º de nossa
carta magna. Isso porque, por mais incrível que possa parecer,
absolutamente tudo está errado na ABIN. Nesse sentido, destacarei aqui a
desinformação consolidada no país sobre o real significado da
denominação “Inteligência” em seus serviços secretos, que representa uma
hecatombe nacional, e que explico minuciosamente em meu livro “SERVIÇOS SECRETOS - Aspectos do emprego das operações sigilosas no estado democrático de direito".
Trata-se de uma desinformação, por
manipulação logomáquica, que foi originalmente produzida com ao término
da “guerra fria”, a partir dos serviços secretos anglo-saxões,
objetivando vencer a elevada rejeição social que sofriam. E a
comprovação cabal, em autoria e materialidade, dessa escabrosa
desinformação dos serviços secretos no mundo está estampada na
denominação oficial que passaram a adotar, a partir de então, pela
aparentemente inofensiva introdução do termo “inteligência”, em
substituição ao termo “informações”.
Na verdade, essa manipulação,
aparentemente semântica, foi inteligentemente acompanhada de um discurso
oficial politicamente correto de respeito às liberdades individuais e
garantias democráticas; mas que, insidiosamente, visava a enganar as
sociedades quanto aos seus reais propósitos clandestinos, dando a falsa
impressão de inauguração de uma nova era de ruptura com essas mesmas
práticas.
No Brasil, esta desinformação foi
perpetrada no país pela “comunidade de inteligência” que criou a ABIN e o
SISBIN, pela lei 9883, de 07/12/1999, no governo Fernando Henrique
Cardoso. Consequentemente, a ABIN recusou-se peremptoriamente a
denominar-se Agência Brasileira de Informações, à semelhança do seu
antecessor Serviço Nacional de Informações (SNI); para assumir-se
Agência Brasileira de Inteligência. Destarte, de forma congênere, e em
reação em cadeia, os demais serviços secretos nacionais procederam da
mesma forma, a exemplo do CIE, que trocou sua denominação oficial de
Centro de Informações do Exército para Centro de Inteligência do
Exército.
O que isso mudou de fato nos serviços secretos do mundo e no Brasil?
Nas grandes potências democráticas
mundiais, como EUA, Alemanha, França, Inglaterra, Israel, dentre outras,
seus serviços secretos continuaram a realizar incólumes e pelo mundo
afora as mesmas práticas clandestinas e criminosas de sempre. Mas, por
outro lado, passaram a ter o controle cerrado e democrático de suas
atividades sigilosas pelo estado constituído, especialmente pelo
parlamento desses países.
No Brasil, no entanto, a partir da
criação da ABIN/SISBIN, instalou-se definitivamente o caos e a
ineficiência no âmbito da inteligência nacional. Porque, nesse mister,
importa relembrar que, antes da degenerescência do SNI/SISNI, o Brasil
pode-se orgulhar de ter tido um serviço de informações que prestou
relevantes serviços ao país e que possuía reconhecimento da comunidade
internacional por sua excelência. Todavia, atualmente e diferentemente
das grandes potências mundiais, o estado brasileiro não possui controle
algum sobre a ABIN/SISBIN, que permanece blindada como sendo a maior,
mais poderosa e ineficiente caixa-preta do país.
Contudo, a referida desinformação,
por manipulação logomáquica, que acomete gravemente o Brasil sobre a
denominação “inteligência” em seus serviços secretos é ainda mais
profunda. Porquanto ela também se aplica igualmente ao termo
“informações”.
Afinal, no âmbito dos serviços
secretos, seja no Brasil ou no mundo, qual a diferença real entre
denominar-se “informações” ou “inteligência”?
Resposta: Nenhuma.
Consequentemente, o aprofundamento
das consequências nefastas dessa desinformação produzida pela ABIN no
Brasil consolidou também a estratégica e sub-reptícia manipulação mental
de toda a sociedade que, uma vez transformada em zumbi, acredita
piamente que, no âmbito dos serviços secretos, “informações” e
“inteligência” são sinônimos, quando de fato não são.
Confuso, não é mesmo?
Pois esse é o “modus operandi” de toda desinformação logomáquica. Ou seja: confundir as mentes, para manipular as sociedades.
E o golpe de misericórdia sobre a
sociedade brasileira dessa desinformação logomáquica, desferido pela
“comunidade de inteligência”, se deu pela promulgação da própria lei de
criação da ABIN/SISBIN, que institui no país que a atividade-fim da
Inteligência de Estado é a “obtenção, análise e disseminação de
conhecimentos dentro e fora do território nacional sobre fatos e
situações de imediata ou potencial influência sobre o processo decisório
e a ação governamental...” ( § 2o , Art 1º da lei 9883, de 07/12/1999).
Consequentemente, “legitimou-se” uma
teratológica, prejudicial, disfuncional e irreversível heresia no país,
instituindo no Brasil um absurdo institucional, sem precedentes no
mundo desenvolvido: a transformação dos seus serviços secretos
(ABIN/SISBIN) como sendo o sistema de informações do estado brasileiro,
com a séria agravante de ter a ABIN como seu órgão central.
E o pior de tudo é que, como essa
desinformação logomáquica está definitivamente consolidada pela
“comunidade de inteligência” no país, o Brasil-zumbi-desinformado é
incapaz de desvelar que: assim como não é o Sol que gira em torna da
terra, mas sim o contrário; de forma congênere, não é o sistema de
informações que gira em torno do sistema de inteligência, como é
estupidamente realizado pela ABIN/SISBIN no Brasil; mas sim o contrário,
tal qual é sobejamente realizado nas grandes potências mundiais.
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