A lei 9.883, de 7 de dezembro de 1999, instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN), criando também a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) como seu órgão central, para assessorar a Presidência da República produzindo informações de interesse do Estado, salvaguardando-o de ameaças à nossa sociedade e à soberania nacional. Contudo, a primeira verdade inconveniente que nossos governantes não revelam, por temer retaliação da fúria da “comunidade de inteligência”, é a ineficiência generalizada da ABIN e, por sua influência, do SISBIN. A segunda verdade que a sociedade brasileira desconhece é que o SISBIN não é um sistema brasileiro de inteligência. Nem de fato, nem de direito.
O discurso oficial dos governantes sobre a eficiência da ABIN e do SISBIN é de aquiescência, conquanto tal anuência não corresponda aos fatos. Essa é a postura equivocadamente adotada em relação às instituições públicas nacionais deficientes, sob a pseudojustificativa de que as mesmas devem ser sempre preservadas, a despeito de suas falhas. Destarte, verificam-se a conivência e leniência das autoridades públicas com a ineficiência institucional, ferindo de morte os princípios constitucionais da administração pública e, o mais grave, enganando a sociedade. Todavia, a ineficiência dessas estruturas de inteligência é notória pela sociedade em função das incontáveis contingências nacionais sofridas com total desconhecimento por parte desses órgãos, a exemplo dos ataques terroristas da organização criminosa PCC, que dominou e atemorizou completamente todo o estado de São Paulo, em 2006; da onda de ataques do crime organizado no Rio de Janeiro, em 2010, que demandou a mobilização e emprego das forças armadas; além dos escândalos por eles protagonizados, como o festival de clandestinidades da ABIN na Operação Satiagraha, que desvelou a maior e pior crise de inteligência que vivenciamos na atualidade.
Contudo, não bastasse a ineficiência da ABIN e da sua ação como órgão central do SISBIN, este não é juridicamente um sistema brasileiro de inteligência, pois não possui constituição nacional, nem a devida representatividade.
Os equívocos sobre o SISBIN começam a partir de sua denominação imprópria, porquanto o sistema de inteligência que foi efetivamente criado pela lei 9883 está restrito exclusivamente à esfera de competência e atribuições da presidência da república. Sua constituição limita-se apenas ao Poder executivo federal, não integrando estruturalmente nem mesmo as Unidades da Federação. Estas somente poderão compô-lo mediante ajustes específicos e convênios, à mercê da eventual iniciativa de seus governantes; os quais, todavia, não recebem a devida contrapartida, necessária para fomentar a construção de um sistema de inteligência que pretendesse a representatividade de ser verdadeiramente nacional.
Nesse mister, as unidades da federação são ainda mais desestimuladas a integrarem o Subsistema de Inteligência de Segurança Pública (SISP), que atua no âmbito do SISBIN, porquanto o Decreto 3695 que o institui as desprestigia politicamente, admitindo-as apenas como membros eventuais do seu conselho especial, determinando expressamente que não terão direito a voto. Por importante, vale enfatizar ainda que estão excluídos pela lei 9883 de constituírem o SISBIN instâncias nacionais de legitimidade constitucional, a exemplo dos poderes legislativo e judiciário, bem como o ministério público, que são instituições do estado constituído indispensáveis a um sistema de inteligência que pretenda a legitimidade de ser verdadeiramente brasileiro.
Portanto, é exatamente o próprio diploma legal que institui o SISBIN a determinar e inclusive impedir juridicamente que ele seja um sistema brasileiro, pois está adstrito exclusivamente ao âmbito do poder executivo federal. Por conseguinte, o mais apropriado seria denominá-lo “Sistema de Inteligência da Presidência da República”, “Sistema de Inteligência do Poder Executivo Federal”, ou algo congênere.
Contudo, a terceira verdade inconveniente que a sociedade brasileira desconhece é que o Brasil não tem um sistema brasileiro de inteligência porque simplesmente ele não existe. E nem será possível criá-lo. Pois, a fatídica e derradeira verdade é que o Brasil sequer possui uma Política Nacional de Inteligência.
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