quarta-feira, 3 de março de 2010

Inteligência valorizada

Ao renovar a Lei Patriótica, o presidente Barack Obama dá continuidade a um mecanismo de proteção ao Estado nacional desprezando questões de políticas de governo

Hércules Rodrigues de Oliveira - Professor universitário, mestre em administração

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, do Partido Democrata, renovou no último dia de fevereiro algumas medidas que continuarão a dar mais poder ao governo para realizar investigações antiterroristas, cujo prazo de validade para sua eficácia junto à sociedade norte-americana estava expirando. Com isso, estendeu por mais um ano os protocolos inseridos na conhecida Patriot Act (Lei Patriótica), adotada pelo governo George W. Bush, do Partido Republicano, depois do atentado de 11 de setembro de 2001. Obama dá continuidade a um mecanismo de proteção ao Estado nacional desprezando questões de políticas de governo, pois tanto democratas quanto republicanos governam o país sob a lógica do “destino manifesto”, ou seja, de que há uma missão divina dada aos EUA de ser o guardião da democracia mundial.

Obama repete, à maneira norte-americana, as mesmas atitudes de Israel, que preserva o Estado conduzindo-o além dos princípios consagrados da territorialidade. Os ingleses não vão muito longe, haja vista a visão cinematográfica da permissão de matar, concedida aos agentes de codinome 00, que desastrosamente ceifaram a vida de nosso conterrâneo Jean Charles de Menezes, em 22 de julho de 2005, morto por engano pela unidade armada da Scotland Yard, conhecida por SO19, numa estação do metrô londrino. A medida assinada por Obama evitou solução de continuidade à Lei Patriótica, que teve em parte inspiração em legislação anterior, a Lei de Vigilância da Inteligência Estrangeira, de 1978. As solicitações do Federal Bureau of Investigation (FBI) – Escritório Federal de Investigação – se refere a revistas em residências, escritórios, quartos de hotel e veículos, instalação de câmeras ocultas, revistas de equipamentos, gravação de telefonemas, interceptação de correio eletrônico e acesso a caixas de segurança, sobre quaisquer pessoas, mantendo sob vigilância, estrangeiros em território norte-americano suspeitos de terrorismo, mesmo que não se tenha indícios de sua ligação a grupos fundamentalistas.

O FBI – a polícia federal dos EUA –, por questões de segurança nacional, não divulga detalhes sobre suas atividades, e aos comitês formados pelo Congresso o faz por meio de resenhas. Questões como essas estão ferindo o american way (estilo americano), comportamento desenvolvido no século 17 que propõe os princípios de vida, liberdade e a procura da felicidade, mas que estão sendo violados enquanto direitos civis. De boa lembrança a passagem de Aléxis Tocqueville pela América em 1831, onde por nove meses conversou com aquela gente, fez leituras e observações, resultando na famosa obra A democracia na América, em que mostrou ao mundo um país com instituições que garantiam a felicidade do homem comum; a liberdade de imprensa, de reuniões, de associações, de organização popular, de religiões, e a inexistência de hierarquias nas relações sociais. Que livro Tocqueville escreveria agora? Registre-se que a data de expiração do prazo de aplicação da Lei Patriótica foi caso pensado pelo Congresso norte-americano, que, na sua aprovação à época, feita a toque de caixa, se deu em razão das necessidades inadiáveis de salvaguarda do território dos EUA, em razão dos ataques suicidas contra o World Trate Center, em Manhattan, o Pentágono, no condado de Arlington, e restos de fuselagem do avião American Airlines, voo 77, encontrados nos arredores de Shanksville, na Pensilvânia, cujo destino final, segundo a Central de Inteligência Americana (CIA), seria o Capitólio, em Washington (D.C). “Todos Admitem que esta lei foi aprovada no momento em que era literalmente impossível examiná-la com cuidado”, disse David Cole, professor de Direito da Universidade de Georgetown, concluindo: “A Lei Patriótica necessita de emendas para conciliá-la com a Constituição, fortalecer os controles para sua aplicação e proteger a privacidade”. Lá, segundo Cazuza: “O tempo não para”.

Enquanto isso, no Brasil, o ministro de Estado chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República (PR) prorroga por mais 90 dias, a contar de 20 de fevereiro, o prazo de funcionamento do grupo de trabalho, constituído para assessorar o Comitê Ministerial para Elaboração da Política Nacional de Inteligência (PNI) e, se for o caso, de reformulação do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin), instituído pela Lei 9.883, de 7 de dezembro de 1999. Faz um ano dia 18 que o grupo foi criado.

Um comentário:

  1. Francisco J.S. da Silva5 de março de 2010 às 20:23

    Os EUA são realmente um país notável. Arvoram a bandeira da liberdade, mas não hesitam em tomar medidas autoritárias para garantir o tal "American Way of Life". Será que perceberam que o Homem não está preparado para viver a tal liberdade? Pra garantir, tornou-se necessário "Big Brotherlizar" a Sociedade. Pesada é a cabeça que carrega a Coroa!!!

    ResponderExcluir

Dê sua opinião, livremente, respeitando os limites da legalidade e da ética.

Fórum da Inteligência

Este é um espaço destinado ao debate e à manifestação democrática, livre, coerente e responsável de idéias sobre Inteligência.