segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Pré-sal e lei de propriedade industrial

O Globo 17/08/09
Luciano Viveiros

RIO - Em consequência da interpretação paradoxal da Lei de Propriedade Industrial no que concerne aos inventos não pertencerem ao autor se extraídos no decurso de um contrato de emprego e, consequentemente, pela ausência de comando legal expresso na CLT ou pela omissão do legislador em discutir com mais propriedade questão tão delicada e controvertida, é cada vez mais necessária a introdução de norma protetora que defenda a inteligência humana e incentive o intelecto dos que pretendem criar e inventar no país.
O advento das novas descobertas do pré-sal (petróleo), gás e biocombustíveis, somado à implantação dos polos de inovação que tomaram de assalto o Brasil nos últimos anos em face de uma incomensurável fonte de recursos minerais disponíveis e, por consequência, acentuada carência de capital humano com capacidade de administrar esses ecossistemas disponibilizados pela natureza, implicam importante lição de casa: o país será impingido a assumir a responsabilidade de explorar esses recursos e disponibilizá-los para a humanidade, mas terá que assumir seu papel de nação desenvolvida e capaz de utilizar sua própria mão de obra nessas atividades.
Hoje, o Brasil não dispõe de condições técnicas, intelectuais nem logísticas para se empenhar nesta delicada pesquisa. Ademais, vê seus cientistas evadirem-se para outros países na busca de melhores salários e condições de trabalho. Assim, irá deparar com um processo de inevitável colapso caso não tome – imediatamente – iniciativas necessárias à criação de um grande sistema nacional de qualificação de recursos humanos e recuperação dos profissionais que perdeu durante os vários anos de estagnação econômica e regimes populistas, militares e neoliberais ineficientes.
Será necessário criar uma nova ordem educacional capaz de oferecer ao mundo a certeza de que o país estará disputando a condição de desenvolvido e preparado para recepcionar os avanços decorrentes dos “novos paradigmas do trabalho”. Isso nos permitiria dividir com EUA, Europa, Canadá, Japão e outros asiáticos as benesses decorrentes de um país de primeiro mundo. E, só por meio de um novo pacto estabelecido pela sociedade, governo, investidores e sócios de mercados globalizados, o Brasil poderá superar os desafios para construção de uma renovada casta de “iluministas” capazes de escrever um novo capítulo da história na direção de um futuro próspero e sustentável.
Não há justificativas que possam superar a ausência de um preceito legal para defender e manter uma nova concepção dos “iluministas contemporâneos” para enfrentar os desafios tecnológicos que nos esperam. Se houve um interesse econômico maior e capaz de permitir que o empregado inventor não tivesse direito a receber uma obrigatória bonificação pela sua capacidade criativa, certamente, soçobraria diante dos mais novos desafios que o país atravessará no campo das pesquisas, descobertas e demais frentes de desenvolvimentistas no campo tecnológico. Esse futuro próspero se construirá, principalmente, pela capacidade intelectual dos brasileiros, que serão submetidos ao constante e renovado conhecimento das mais desafiadoras e inovadoras fontes de recursos e de inúmeras máquinas e equipamentos utilizados, principalmente, para extração dos recursos naturais resultantes da grande biodiversidade acolhida em nosso continente.
Esses novos paradigmas do trabalho correspondem ao desenvolvimento humano e à qualificação de mão de obra para enfrentar os desafios. Porém, se há uma legislação capaz de negar as elevadas preposições de reconhecimento da capacidade criadora e inventiva do ser humano, para remeter a um determinado empregador o singular bônus resultante da criação e da invenção, sem dúvida, aqueles que estiverem vinculados à máquina produtiva e nela atuando como empregados, jamais, se sensibilizarão em contribuir com criatividade caso esta não seja recompensada dignamente.
Entretanto, fruto de um considerável sistema vetusto e contraditório, se construiu uma legislação (Lei da Propriedade Industrial) que, em 1979, não vislumbrava essas novas imposições e nem mesmo seria capaz de absorver esse modelo flexível de contratação e os novos conceitos de pactuar para que as partes possam obter vantagens produtivas. O mesmo ocorre em outra legislação de 1943 (CLT), na qual nem mesmo havia a indústria reconhecida como importante meio de produção. Em ambas as legislações, não se verificam prospecções capazes de promover o intelecto como mola propulsora do desenvolvimento.
Portanto, elas precisam de mudanças imediatas e consideráveis para evitar a evasão dos valores humanos e do capital intelectual agregado.
E, para que a mudança seja capaz de delinear um novo modelo de estímulo à invenção, caberá à produção legislativa editar projeto de lei no sentido de redimensionar uma contraprestação decorrente do contrato de emprego aos inventos criados no ambiente de trabalho, capaz de referendar a manutenção dos empregados para contribuir em favor do capital produtivo. Desta união também deve restar consignada a vontade constante e perpétua de promover a criação que – por diante – passaria a ser premiada pela forma mais justa e moral de reconhecimento, de natureza salarial, em favor das pesquisas e da exploração das fontes de recursos materiais e minerais indispensáveis à sobrevivência dos seres humanos, sempre, favoráveis ao desenvolvimento da capacidade intelectual dos próprios brasileiros.
* Advogado e professor da Uerj,
FGV e Universidade Candido Mendes.

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