O povo que não estiver disposto a lutar pela sua paz não a merece
André Soares - Mestre em operações militares, empresário do ramo de inteligência
O renomado estrategista militar chinês Sun Tzu disse certa vez: “O objetivo da guerra é a paz”. A frase tem 2 mil anos, o que demonstra, com grande sabedoria, que a guerra pode ser justa, ética e nobre. Magnânimo reconhecimento internacional da arte da guerra ocorreu em 2009, na entrega do prêmio Nobel da Paz ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, comandante em chefe da maior potência bélica do planeta. O que se viu naquela homenagem à paz foi o presidente norte-americano discursar ao mundo uma magnífica exaltação à arte da guerra, que não deve ser entendida como uma “maldição dos militares”, pois guerras são deflagradas por políticos e não por soldados, embora sejam esses os que empenharão seu sangue e as próprias vidas em defesa da pátria. Se guerras são lutas entre nações – e não disputas entre exércitos –, a arte da guerra é uma condição que afeta ao Estado e à cidadania, não uma prerrogativa militar. O combate e a diplomacia são seus instrumentos e ambos consistem em vencer pelo emprego da força: o combate é a força da dissuasão e a diplomacia a da persuasão. Porém, a arte da guerra quando dissociada de qualquer um deles degenera-se perigosamente.
No Brasil, infelizmente, nossos governantes, ao longo da nossa história, se embriagaram com a estupidez de achar que o pacifismo e o não imperialismo nacionais imunizariam o país contra as guerras, relegando nossas Forças Armadas ao ostracismo operacional. Atualmente, sob o ponto de vista de emprego militar para a defesa nacional, as tropas brasileiras são não operacionais, o que significa que são capazes de lutar, mas não de vencer, porque tropas operacionais são forjadas nas lides do emprego em combate e não dentro dos quartéis. Inúmeras são as deficiências de que sofrem nossas Forças Armadas: ínfimos recursos orçamentários; política nacional de defesa historicamente desencontrada e retórica; defasagem doutrinária de emprego militar; sucateamento do arsenal e indústria bélicos; crescente defasagem e dependência tecnológicas; vultosos e obscuros gastos com aquisição de equipamentos militares exclusivamente à mercê de critérios políticos e personalistas; deficiências de integração tático-operacional das três Forças; desvio funcional e priorização de atividades subsidiárias em detrimento das operacionais; cultura de valorização da atividade-meio e esvaziamento da atividade-fim; poder militar nacional superdimensionado, estruturado exclusivamente em ilhas de excelência das Forças Armadas; grave evasão, notadamente dos quadros de oficiais; e fuga da carreira militar dos jovens brasileiros promissores que, embora vocacionados, acertadamente não se submetem a uma vida indigna de baixos vencimentos. A comemorar, apenas o patriotismo exacerbado dos militares brasileiros, submetidos aos imperativos de uma vida totalizante, de renúncia e dedicação exclusiva ao país, embora marcada por indesejáveis privações impostas à família militar. Assim, há muito por fazer, a começar pela rediscussão do papel constitucional das Forças Armadas brasileiras e do assistencialista serviço militar obrigatório.
É preciso lembrar que guerras não são vencidas apenas com o patriotismo de bravos soldados, mas por tropas profissionais e operacionais. Esse cenário de flagrante vulnerabilidade do poder militar do país, além de comprometer nossa defesa nacional, inviabiliza a pretensão internacional dos nossos governantes de levar o Brasil a conquistar assento no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) como membro permanente. Pura ingenuidade imaginar que o seleto grupo das maiores potências bélicas do mundo (China, França, Rússia, Reino Unido e EUA) aceitará o ingresso de um país com poder militar não operacional como o Brasil. A arte da guerra é a arte de viver, divisor de águas entre vencedores e vencidos, a exemplo da hegemonia dos EUA, que têm bases militares instaladas mundo afora, partícipe de conflitos armados internacionais, como a recente guerra no Iraque, ocupação do Afeganistão e o aprestamento militar para uma eventual intervenção armada no Irã. Que a sociedade brasileira reflita sobre a realidade de nossas Forças Armadas, porquanto a próxima guerra sempre vem, e a história está a demonstrar que a defesa da soberania nacional tem elevado custo. Afinal, o povo que não estiver disposto a lutar pela sua paz não a merece.
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