Artigo de André Soares
Diretor-presidente Inteligência Operacional
“Teoria da conspiração” é a denominação atribuída às idéias paranóicas sobre a existência de ações clandestinas, patrocinadas por agentes adversos, a nos causarem grande prejuízo e destruição. Tais concepções são condenadas ao ostracismo e seus defensores expostos ao ridículo, pois teorias da conspiração são produzidas por mentes doentias e sua única utilidade é na criação de histórias de ficção. Exemplos dessas mentiras estão por toda a parte e, no Brasil, multiplicam-se exponencialmente pela internet, especialmente em ano de eleição presidencial, como atualmente. O que pouca gente sabe é que as principais potências mundiais dão enorme importância às teorias da conspiração e possuem estruturas muito especializadas nesse mister – seus serviços de inteligência.
O que fazem esses serviços? Basicamente, duas atividades: defender-se, detectando e identificando teorias da conspiração em curso e, principalmente, patrociná-las de fato, fazendo-as parecer não existirem. Isso significa que teorias da conspiração constituem terreno nebuloso, potencialmente perigoso e duas atitudes representam grande estupidez – desconsiderá-las, ou alardeá-las, indiscriminadamente. É justamente por esse motivo que não se mencionará aqui nenhuma teoria da conspiração porque, como todos sabemos, elas não existem, não é mesmo?
Assim, seja na vida pessoal, profissional, nos governos e nas relações internacionais, algumas sutilezas que sempre passam despercebidas merecem especial atenção. Portanto, deve-se suspeitar da impunidade institucional, pois ela não é apenas mera conseqüência de deficiências estruturais generalizadas, mas sim a promiscuidade de autoridades com o poder, e a pior manifestação da corrupção dos tribunais. Deve-se suspeitar de assessores, profissionais, chefes, superiores, subordinados, autoridades e governantes que sempre afirmam estar tudo dentro da normalidade e sob controle, pelo simples fato de que isso é mentira. Deve-se suspeitar de infiltração por organizações criminosas em obscuros projetos e empreendimentos, notadamente os de interesse nacional, que, a despeito do grande esforço, tempo e recursos envidados, nunca dão certo. Deve-se suspeitar de ações clandestinas e da atuação de serviços de inteligência internacionais nas tragédias e graves acidentes, particularmente os que atingem setores estratégicos do poder nacional, que geralmente custam vidas de pessoas inocentes, cujas apurações nunca apontam culpados e são rapidamente esquecidos. Por fim, mais que suspeição é a certeza de que estes últimos casos sempre encobrem crimes de traição à pátria e à soberania nacional, perpetrados nos mais elevados escalões governamentais.
Portanto, proteger-nos contra essas ameaças é a razão de ser dos serviços de inteligência nacionais, guardiões do estado e da sociedade brasileira. Todavia, a eficiência dessas organizações no país é, no mínimo, bastante discutível. Para isso, basta relembrar apenas algumas contingências nacionais recentes, pois os nossos serviços de inteligência foram incapazes de prever invasões criminosas que já vitimaram o próprio Congresso Nacional; o caos da aviação brasileira, que comprometeu a segurança dos vôos no país, entre 2006 e 2007; a ocupação da sensível usina hidrelétrica de Tucuruí, que vulnerabilizou o abastecimento nacional de energia; a destruição de centros de pesquisa da Embrapa, que comprometeu o nosso desenvolvimento científico-tecnológico; os ataques terroristas da organização criminosa PCC, que dominou e atemorizou completamente todo estado de São Paulo, em 2006; e não descobriram absolutamente nada sobre o grampo ilegal do qual foram vítimas o senador Demóstenes Torres e o então Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, em 2008, que ameaçou as instâncias máximas dos poderes da República.
Felizmente, eficiência não faltou à Polícia Federal e à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Interceptações Telefônicas, que desvelaram ao país um festival de clandestinidades acobertadas pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), na Operação “Satiagraha”, deflagrando a maior e pior crise institucional de inteligência da nossa história.
O mais intrigante foi a atitude do presidente Lula, pois nem nas piores crises dos seus dois mandatos exonerou qualquer de seus principais assessores. Entretanto, nesse caso, nosso presidente não hesitou em afastar de imediato e definitivamente, antes mesmo do início das investigações, o Diretor-Geral e toda a cúpula da ABIN, que é o órgão máximo do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN).
O resultado de tudo isso? Uma ABIN incógnita, onerosa, ineficiente e sem controle, que em mais de dez anos nunca deu certo; a impunidade do mais grave escândalo nacional de inteligência, cujos culpados nunca foram apontados; e a inação e rápido esquecimento das autoridades nacionais sobre fatos dessa gravidade.
O que realmente está acontecendo? Certamente, nada. Tudo está rigorosamente dentro da normalidade e sob controle. Afinal, como todos nós sabemos, teorias da conspiração não existem, não é mesmo?
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