“O povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la” é reflexão muito conhecida que lamentavelmente se aplica perfeitamente ao Brasil, porque a sociedade brasileira desconhece significativa parcela da história contemporânea nacional dos últimos 60 anos. Como “a história é contada pelos vencedores”, evidentemente existem duas. A história oficial é a versão dos vitoriosos, doutrinariamente disseminada à sociedade, especialmente aos jovens. Porém, é a história verdadeira que os cidadãos deveriam se empenhar em conhecer. Contudo, pior que um país que não conhece a própria história é um país que a perdeu, e o Brasil é um infeliz exemplo dessas duas tragédias.
As informações divulgadas sobre o período obscuro do país denominado “anos de chumbo” - ou seria “período da subversão?” - são originalmente tendenciosas e referem-se a um passado que existiu de fato, mas não de direito. Sobre ele, nosso país é incapaz de contar até mesmo a história oficial. Afinal, quem são os vencedores?
Quanto a isso, governos militares e civis nada fizeram, pois essa é uma verdade que os compromete indistintamente; tendo sido sepultada aos olhos da sociedade, cuja investigação sempre foi perigosamente proibida. Não por acaso, assistimos há décadas a total ineficiência dos poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, e do Ministério Público em abrir os “arquivos da ditadura”, blindados na “caixa-preta” dos serviços de inteligência nacionais, em flagrante e arrogante desrespeito ao texto constitucional e ao Estado democrático de direito vigentes. Somente o governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva mobilizou-se efetivamente pela busca das ossadas dos desaparecidos políticos.
O resultado de tudo isso? Nada de ossadas de desaparecidos políticos, nada de abertura de “arquivos da ditadura” e nada de história oficial. Quanto à história verdadeira, essa nem pensar! Apagar o passado é muito mais difícil que contá-lo e vivemos num estado constituído impotente em revelá-lo e prestar contas à sociedade, vencido que foi pelo medo daqueles que “desaconteceram” a história nacional, pelo muito que têm a esconder, a temer e a pagar, por crimes cometidos da maior gravidade. Portanto, a esperança da sociedade brasileira em conhecer a sua própria história não mais se tornará realidade, pois a verdade é que as ossadas dos desaparecidos políticos foram alvos de ações clandestinas cirúrgicas e tudo o que o país deveria saber sobre esse passado foi criminosamente e meticulosamente destruído.
Sem ossadas, sem arquivos, sem passado, mas subsiste a disputa fratricida das versões. Assim, a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República do governo Lula lançou o livro “Direito à memória e à verdade”. Em contrapartida, sentindo-se perigosamente ameaçados pela esquerda no poder, setores de uma direita pusilânime e sem rosto, tenta impor sua versão à sociedade, revelando do seu ostracismo um desacreditado dossiê de codinome “Orvil” (a palavra “livro”, ao contrário); outrora um dos mais secretos e poderosos instrumentos do arsenal de guerra política da cúpula desses serviços de inteligência.
Em 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou os efeitos da Lei de Anistia de 1979, esquivando-se da oportunidade jurídica de corrigir sua degenerescência em amnésia histórica e indústria extorsiva de indenizações contra o Estado; premiando assassinos, torturadores, seqüestradores e terroristas, com a impunidade.
Atualmente, a presidenta Dilma Rousseff, que vivenciou a realidade intestina desse nebuloso passado, enfrenta antagonismos em seu governo, protagonizados pelos comandantes militares e a cúpula das Forças Armadas; indisfarçavelmente contrários à criação da “Comissão Nacional da Verdade”, destinada à investigação dos crimes ocorridos nesse período, temerosos que essa iniciativa esteja a propósito de obscuras retaliações.
A verdade é que o Brasil sem história já está revivendo seus próprios erros e caminha às cegas em sua ignorância incapaz de distinguir cidadãos de criminosos. Nossa história recente é um livro de páginas arrancadas, literalmente trituradas, incineradas e lançadas ao vento; que nossos legítimos governantes pretendem resgatar, conquanto tardiamente. Se nosso país perdeu definitivamente a sua história verdadeira, resta à inepta sociedade brasileira conformar-se com a construção de uma história oficial. Afinal, ao menos saberemos quem são os vencedores.
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