Hércules Rodrigues de Oliveira -Professor universitário, mestre em administração
Aqueles que não aprendem com a história estão condenados a repeti-la. Em 25 de junho de 1950, começava a Guerra da Coreia, que terminou com o cessar-fogo em julho de 1953. De boa lembrança, o registro de que, em 1905, o Japão havia forçado a Coreia a assinar o Tratado de Eulsa, no que transformou a Coreia em um protetorado, sendo anexado ao país do Sol Nascente em 1910. A Coreia, até então uma nação não soberana, com o fim da Segunda Guerra Mundial, assistiu nas suas terras ao ocaso do Exército samurai. Estados Unidos e Rússia concordaram em aceitar a rendição do Japão e, com isso, estabeleceu-se o paralelo 38 Norte como marco da divisão para a capitulação japonesa.
Hoje, percebemos que a ideia se mostrou desastrosa, pois se dividiu o país em dois: ao norte, russos e chineses socialistas, contrapondo-se ideologicamente ao Sul, sob a guarda do capitalismo norte-americano e britânico. Com a saída das tropas estrangeiras do Sul, o Norte avança buscando a unificação das Coreias sob a égide comunista. O Ocidente (leia-se EUA), por intermédio da Organização das Nações Unidas (ONU), reage enviando tropas sob o comando do general Douglas MacArthur, que seguem vitoriosas em direção ao Rio Yalu, próximo à fronteira sino-coreana, vindo de encontro aos interesses expansionistas de Mao Tsé-tung,, bem como os de Moscou, seu aliado, que começam ali a perder geopoliticamente uma futura base de apoio para um possível ataque ao Japão. Diante de cenário tão improdutivo, a China, de olho também na unificação de Taiwan, apoiada pelo Kremlin, desce em socorro dos norte-coreanos, com expressiva vantagem numérica de seu Exército Popular de Libertação, que empurra as tropas da ONU de volta ao paralelo 38 Norte. O conflito se encerra com a assinatura do cessar-fogo somente quando assume o presidente Dwigth Eisenhower, que ameaçou detonar armas nucleares contra a China e a Coreia do Norte caso o conflito persistisse.
Passados 60 anos, o mundo assiste a nova tensão na Ásia, protagonizada pela Coreia do Norte, envolvendo os mesmos países do início do conflito em 1950: Coreias, EUA, China, Japão e Rússia. A guerra avizinha-se face a ataques a navios sul-coreanos supostamente advindos dos norte-coreanos e, como resposta, exercícios militares perto da zona desmilitarizada pela Coreia do Sul e constante presença naval, tanto norte-americana como sul-coreana no mar do Japão. Em questões como esta, imperiosa a presença da atividade de inteligência, basicamente no seu emprego como inteligência “clássica”, com fins militares, para antecipar as ações e reações dos atores envolvidos, em que a geografia passa a ser a chave de toda esta história.
Operadores de inteligência já identificaram no horizonte o que se conhece pelo “espectro dos conflitos”, pois a história se faz presente com os mesmos atores de 60 anos, que, apesar do término da Guerra Fria, continuam antagônicos em seus interesses geoestratégicos. Lembremos que China e Rússia buscam a multipolaridade para fazer frente à nova ordem mundial, conduzida pelo governo estadunidense. Esse espectro se apresenta por gradação diante de diferentes formas de emprego da força, que se iniciam desde ações não violentas, ameaças, por exemplo, ao emprego da força, seja demonstrando capacidade militar, lançando mísseis ou, de forma objetiva, destruindo unidades de fronteira do oponente, cujo ápice será inevitavelmente o disparo de artefato nuclear, caso os tenha.
Caminhamos para uma crise que deve ser tratada com cautela, para que não se percam de vista as reais questões políticas e os interesses de cada ator envolvido. Imprescindível a atuação da inteligência neste contexto para identificar a graduação do emprego ou da simples ameaça de emprego dos meios de força pelos Estados nacionais envolvidos no conflito. John Keegan mostra a importância permanente do papel da inteligência para o processamento e a manipulação dos conhecimentos, como se viu na Guerra do Iraque, em que os serviços de inteligência norte-americano e inglês afiançaram ao mundo a existência de armas de destruição em massa para justificar a invasão de um país soberano. O ex-presidente norte-americano George W. Bush, como fez em relação ao Iraque, também alcunhou a Coreia do Norte e o Irã como países integrantes do eixo do mal. O espectro do conflito já está sob estes dois governos. Caso o mundo não reaja, será apenas uma questão de tempo.
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