Artigo de André Soares - 06/12/2010
Você quereria saber o futuro?
Antes de responder, reflita sobre esta ficção:
Um artista milionário que ficou mundialmente famoso arriscando perigosamente sua própria vida, repentinamente teve um mal-súbito. Antes de morrer, amparado nos braços de um jovem transeunte seu admirador, balbuciou-lhe que lhe confidenciaria o segredo de todo o seu grande sucesso. Revelou-lhe, então, que seu segredo estava na posse de um relógio especial, que só marcava uma única data e horário – a da morte do seu detentor. E para sabê-la bastava olhar para o referido relógio.
O jovem transeunte passou dias perturbado com a idéia de poder saber a data de sua própria morte. E num rompante de súbita coragem resolveu encarar o tal relógio que havia recebido. O relógio especial revelou-lhe imediatamente seu fatídico destino, mostrando-lhe uma data que significava que ele morreria muito velho; e que, portanto, ainda teria décadas e décadas de vida.
Dominado, assim, pela esfuziante alegria de saber que viveria demais, este jovem entendeu o motivo de todo o enorme sucesso do falecido artista, pois em seus arriscados espetáculos que fazia ele sabia que nunca morreria, pois seu dia não havia chegado.
Assim, este jovem passou a ter a mesma carreira de muita fama, sucesso e dinheiro, realizando espetáculos “de morte”, tão arriscados como o do seu antecessor.
Contudo, pouco tempo depois, num de seus espetáculos, se acidentou gravemente, mas certamente não morreu. Todavia, ficou tetraplégico, cego e mudo.
E na UTI do hospital, apenas ouvindo, pois não podia mais se manifestar, sofria por saber que estava condenado a viver naquela condição ainda por muitas décadas. Foi então, que ouviu um médico dizendo aos colegas que havia encontrado um relógio estragado com o infeliz paciente, pois o mesmo só marcava a data da manhã do dia seguinte.
O principal propósito dessa mórbida ficção é trazer à nossa reflexão que o crescente acúmulo do conhecimento humano nos aproxima cada vez mais da capacidade de saber a verdade. E conhecendo a verdade sabemos cada vez mais sobre tudo, inclusive sobre o que está por vir – o futuro.
Você quereria saber o futuro?
Os apressados responderão que sim, pois adorariam ficar milionários, sabendo antecipadamente os resultados das loterias.
Contudo, além dessas e outras vantagens, saber o futuro é o poder do conhecimento, que nos permite saber o destino das coisas, e também o nosso próprio destino, o nosso próprio fim.
Aí está a explicação para a epidemia de transtornos e doenças mentais que vivemos no século XXI, já devidamente alardeada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pois vivemos também na era da informação e do conhecimento, na qual as pessoas se aproximam cada vez mais da verdade. Desta forma, a multiplicidade de diversificadas fobias e patologias psicológicas da atualidade tem como única origem causadora – o medo da morte, cada vez mais perturbador com o conhecimento da verdade. Não por acaso, o grande filósofo sempre dizia que a verdade é feia. Significa que caminhando na direção do conhecimento a humanidade está seguindo no sentido oposto ao da felicidade, sofrendo e enlouquecendo.
É por isso que a ignorância é o melhor e único caminho da felicidade. Pois, a ignorância é a realidade do não saber. E quem não sabe não sofre. E quem não sofre é feliz.
Viver é escolher. Escolher é decidir. E a decisão de se viver a felicidade e a verdade traz, inescapavelmente, seu bônus e seu ônus.
A felicidade implica viver a alegria da ignorância suicida.
A verdade implica viver o sofrimento do saber libertador.
Afinal, felicidade e verdade são benção, ou maldição?
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