sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Wikileaks à mineira

Servidora da Câmara questiona em site contratos fechados pela Casa e assunto estoura na internet. Funcionária teria sido ameaçada de demissão
Amanda Almeida - Estado de Minas 17/12/2010 

 
Do outro lado do oceano, em Londres, o australiano Julian Assange, fundador do site Wikileaks, foi libertado ontem depois de nove dias de prisão. Acusado de estupro, o motivo da reclusão teria encoberto interesses políticos e econômicos. Depois de a divulgação de documentos sigilosos ter mexido com grandes potências mundiais, informações bem incômodas alardeadas por uma versão mineira de Julian agitaram a Câmara Municipal de Belo Horizonte ontem. Ao questionar preços de contratos da Casa, a servidora Núbia Souza, de 24 anos, teria sido ameaçada de demissão pela Coordenadoria de Comunicação da Câmara. A presidente da Casa, Luzia Ferreira (PPS), nega qualquer tipo de retaliação.

Em outubro do ano passado, Núbia e amigos tiveram a ideia de criar um site que divulgasse informações de órgãos públicos. “É parecido com o Wikileaks, mas tem uma diferença: ao contrário dele, a intenção é usar somente documentos públicos. Queremos cruzar informações para investigar irregularidades”, diz. Segundo ela, que é formada em sistema da informação, o arquivo tupiniquim de documentos oficiais começou em São Paulo, com o grupo Esfera, e se espalhou pelo Brasil com o nome de Transparência Hack. Em breve, os mineiros vão lançar um site para divulgar levantamentos. Em meio a pesquisas para o grupo, Núbia encontrou dois contratos curiosos na Câmara Municipal de BH, onde trabalha há cinco anos como servidora terceirizada da Diretoria do Legislativo.

De acordo com o site de transparência da Câmara, em agosto de 2010, a Casa adquiriu 30 pacotes de 100 copos plásticos por R$ 681. Ou seja, cada pacote, comprado em supermercado por cerca de R$ 5, custara R$ 26 à Casa. Já em março de 2009, segundo o site, foram comprados 500 CDs regraváveis por R$ 56 a unidade. “Indignada com os valores, eu tuitei os contratos no início do ano e as pessoas foram divulgando pela internet”, afirma Núbia. O assunto estourou na web e teria chegado aos ouvidos da Coordenadoria de Comunicação. “Na quarta-feira, minha chefe me chamou e disse que a comunicação queria me demitir por eu ter falado mal da Câmara. Mas, como sou uma boa funcionária, ela tentaria me manter. Não fiz nada errado. Apenas falei sobre um assunto que é público.”

O clima esquentou na Casa e alguns vereadores procuraram Núbia para entender o caso. No fim do dia, a presidente Luzia Ferreira negou a ameaça. “Não houve isso. Nós prezamos pela liberdade de expressão de qualquer pessoa. A chefe conversou com ela para saber o que ela estava divulgando, se eram informações sigilosas da Casa. De qualquer maneira, vamos investigar se houve a ameaça. Qualquer funcionário é livre para manifestar sua opinião”, diz Luzia. Sobre os contratos, ela afirma que houve erro de digitação e um mal-entendido.

“Todos os materiais da Câmara são adquiridos por milheiro. Ou seja, compramos 30 pacotes de 1 mil copos, que estavam divididos em pacotes com 100 copos. Ou seja, compramos 1 mil copos por R$ 26. Já em relação aos CDs foi erro de digitação. Não era R$ 56 a unidade, mas R$ 0,56. Todas as notas fiscais estão arquivadas e podem ser conferidas”, diz Luzia. Depois do susto na Câmara, Núbia diz que o movimento mineiro crescerá. “Vamos lançar o site com informações sobre a Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O Wikileaks fez um barulho maior do que o nosso, mas ficar de olho no poder público tem sempre seu mérito.”

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