quarta-feira, 29 de julho de 2009

Venezuela retira embaixador da Colômbia em meio a acusações sobre bases americanas e armas das Farc

Correio Brasiliense 29/07/09

América do Sul
Intriga na fronteira

Silvio Queiroz

Uma denúncia do governo colombiano, segundo a qual foram apreendidas com a guerrilha esquerdista armas antitanque de fabricação sueca vendidas originalmente à Venezuela, entrelaçou-se com o anúncio sobre a cessão de três ou quatro bases aéreas colombianas para operações militares dos Estados Unidos — e o resultado é um cenário que preocupa o governo brasileiro. “Não é agradável ver essa militarização excessiva da América do Sul, com a presença de atores extrarregionais”, disse ao Correio uma fonte do Itamaraty. “Isso não contribui para um ambiente pacífico e de cooperação, inclusive no âmbito militar, no continente.”
O comentário reservado do diplomata brasileiro reflete a tensão crescente entre dois vizinhos que nos últimos sete anos — desde que o direitista Álvaro Uribe assumiu o governo na Colômbia — protagonizaram sucessivas crises, algumas delas contornadas com ajuda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na noite de ontem, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, anunciou o “congelamento” das relações e a retirada de seu embaixador em Bogotá. Chávez denuncia “mais um plano de invasão gringa” a seu país, e antecipou que negociará um aprofundamento da cooperação militar na visita que fará dentro de 15 dias a Moscou. Nos últimos três anos, Caracas importou da Rússia aviões, helicópteros, 100 mil fuzis e sistemas de defesa antiaérea.
O chanceler venezuelano, Nicolás Maduro, não hesitou em fazer a ligação direta entre os dois movimentos do governo colombiano. Comentando a acusação sobre a apreensão de um lote de foguetes antitanque (bazucas) de fabricação sueca em um acampamento das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Maduro denunciou “uma montagem grosseira”, como “pretexo para as bases militares americanas em território colombiano”, disse. “Sempre que surge um tipo de conjuntura, começa a funcionar o aparato de mídia para construir meias-verdades a partir de mentiras e justificar o injustificável.”
É no mesmo tom que a intriga envolvendo os dois vizinhos, mais a Suécia e os Estados Unidos, é tratada por um representante da assediada esquerda civil colombiana, vista com desconfiança tanto pelos militares quanto pela guerrilha. “O mais estranho é que o governo só fala nessas armas suecas agora, em pleno processo de instalação dessas bases americanas”, disse à reportagem o dirigente comunista Carlos Lozano, interlocutor habitual com as Farc em assuntos de ordem humanitária. “Dizem que se trata de cooperação com os EUA para enfrentar ‘o narcotráfico e o terrorismo’, mas isso servirá apenas para prolongar e agudizar o conflito armado interno que temos em nosso país.”
Lozano nota o “incômodo” causado pelo acordo militar na vizinhança, e afirma que a Venezuela não é o único país sul-americano com razões para observar com atenção o desenrolar da crise. “É uma manobra com duas direções: acabar com as Farc e estabelecer uma plataforma de espionagem não apenas sobre a Venezuela, mas também o Equador e até o Brasil, pois os americanos não têm muita confiança no governo brasileiro, que lidera uma posição independente na América do Sul”, analisa.

Correio eletrônico
Rumores sobre a presença de armamento moderno contrabandeado pelas Farc, inclusive mísseis antiaéreos que colocariam em risco a aviação — fator de desequilíbrio do conflito em favor do Exército, nos últimos anos — se intensificavam desde o início do ano. Mas em sua edição mais recente a revista colombiana Semana reconstituiu a história da apreensão, feita “há alguns meses” no sudeste do país, como parte das operações contra o chefe de operações militares da guerrilha, conhecido como Mono Jojoy. Os números de série teriam sido rastreados pela Suécia e associados a um lote vendido legalmente à Venezuela.
A revista teve acesso ao texto de mensagens eletrônicas extraídas pelos militares do computador do comandante guerrilheiro Raúl Reyes, abatido em março de 2008 no bombardeio a um acampamento do lado equatoriano da fronteira. Neles, outro alto dirigente rebelde, Iván Márquez, menciona entendimentos com militares venezuelanos para a compra de bazucas (leia trechos).
Desde a morte de Reyes, o governo equatoriano suspendeu as relações com a Colômbia, e a Justiça do país pediu a prisão do ex-ministro colombiano da Defesa Juan Manuel Santos, como responsável pelo ataque. No início deste mês, o governo colombiano divulgou um vídeo no qual o Mono Jojoy afirma que as Farc teriam feito uma contribuição financeira (1)para a campanha eleitoral do presidente equatoriano, Rafael Correa.

1 - GUERRILHA DESMENTE
As Farc desmentiram o envio de dinheiro para a campanha de Rafael Correa. “Como nova cortina de fumaça e na tentativa de agredir o senhor presidente do Equador, Washington e Bogotá manipularam um vídeo das Farc”, diz o comunicado. Correa pedira aos rebeldes “um pronunciamento claro” sobre as acusações de Bogotá. “Negamos ter entregue dinheiro a qualquer campanha eleitoral de qualquer país vizinho”, arremata o texto, assinado pelo secretariado (alto comando das Farc).

Trechos

E-mail para Raúl Reyes
Como estava previsto, em 3 de janeiro me reuni com os generais (Cliver) Alcalá e (Hugo) Carvajal, com o qual já me havia reunido em três ocasiões na companhia de Ricardo (Rodrigo Granda). Falamos do Plano Patriota, de troca (de prisioneiros), da “parapolítica” e de três aspectos do plano estratégico: finanças, armas e política de fronteiras. (…) Nesse meio tempo, eles farão chegar (na semana que vem) 20 bazucas de grande potência, segundo eles, das quais 10 seriam para Timo (Timochenko, comandante das Farc atuante na fronteira com a Venezuela) e 10 para cá.

Email para Marulanda e demais membros do Secretariado
Os artefatos que recebemos com Timo são foguetes antitanque de 85mm, dois tubos e 21 cargas. O amigo diz que eles têm mais de mil cargas e logo nos entegarão mais, assim como alguns tubos (lançadores).

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