segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Defesa evita polêmica sobre relato de Ustra

O Estado de São Paulo 03/08/09

Documento reaviva debate sobre anistia, diz ex-militante da ALN
Leonencio Nossa

O Ministério da Defesa informou que não se pronunciará a respeito do documento sigiloso assinado pelo então major Carlos Alberto Brilhante Ustra em 21 de agosto de 1972, que atesta a morte do estudante Antonio dos Três Reis Oliveira e da operária Alceri Maria Gomes da Silva em um suposto tiroteio com agentes do Exército. De acordo com a Defesa, trata-se de "questão histórica" e não cabe ao ministério fazer qualquer referência a ela.
Quanto ao fato de o Ministério da Defesa ajudar na procura dos corpos desaparecidos durante a Guerrilha do Araguaia, a assessoria do órgão informou que está cumprindo uma decisão judicial. Por isso, tem feito as buscas. A pasta até instalou uma comissão para o cumprimento da ordem da Justiça, que exige esclarecimentos sobre o episódio.
O casal de guerrilheiros pertencia à Ação Libertadora Nacional (ALN), um dos grupos de oposição à ditadura, responsáveis por ações de guerrilha urbana, entre elas o sequestro, juntamente com o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8) do sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick.
Em sua edição de ontem, o Estado publicou um ofício assinado pelo então major Brilhante Ustra relatando um tiroteio numa casa no bairro paulistano do Tatuapé que resultou nas mortes de Três Reis e Alceri Maria de Souza. Até hoje o Exército nega qualquer envolvimento na morte dos dois, considerados desaparecidos.
A ex-deputada Moema Santiago, ex-integrante da ALN, avaliou que a publicação do documento contribui para mostrar de que lado estavam as pessoas e como os opositores do regime morreram. "Há a Lei da Anistia, mas anistia não significa esquecimento", disse. "Para virar esta página da história, é preciso que a verdade seja revelada", completou.

TIROTEIO
Uma patrulha chefiada pelo capitão Maurício Lopes de Lima, da Operação Bandeirantes, surpreendeu o estudante de economia Antônio dos Três Reis Oliveira e a operária Alceri Maria de Souza num "aparelho", casa que servia de esconderijo, no Tatuapé, relatou Brilhante Ustra. Oliveira teria sido fuzilado no local. Já Alceri possivelmente foi levada ferida pelos agentes, segundo a pesquisadora Myrian Luiz Alves, que atuou na CPI de Perus, instalada em 1991 na Assembleia Legislativa de São Paulo para investigar mortes de opositores da ditadura.
Oliveira foi enterrado como indigente no cemitério da Vila Formosa, em São Paulo. Até hoje a família não localizou a ossada. Antes, o corpo dele foi levado para o Instituto Médico Legal. "O IML registrou os corpos de Três Reis Oliveira e de outros guerrilheiros com um “t” em vermelho", relatou Myrian. Ela observa que em 1970, ano da morte do guerrilheiro da ALN, o regime ainda não tinha consolidado a política de desaparecer com os corpos dos seus oponentes.

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