domingo, 23 de agosto de 2009

Turma da Mônica sob suspeita

Estado de Minas 23/08/09

Ministério Público de São Paulo investiga revistas em quadrinhos de Mauricio de Sousa sob alegação de que publicações carregam propaganda voltada para o universo infantil

Brasília – Uma investigação do Ministério Público (MP) de São Paulo tem como alvo os conhecidos gibis da Turma da Mônica e chama a atenção da sociedade sobre a publicidade voltada para o público infantil. O inquérito civil apura se houve abuso nas revistas por causa de anúncios, dirigidos às crianças, que foram divulgados entre as historinhas de personagens como Cascão, Magali, Cebolinha e Chico Bento, além da própria Mônica.

Autor da representação que resultou na abertura do inquérito, o Instituto Alana (organização sem fins lucrativos que desenvolve atividades voltadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente) critica os anúncios de produtos infantis que foram divulgados. A coordenadora-geral do projeto Criança e Consumo da entidade, Isabella Henriques, diz que meninos e meninas não conseguem saber a diferença entre o que é publicidade e o que é entretenimento. Por isso, acabam sofrendo uma influência direta da publicidade em sua formação. “Só a partir dos 12 anos é que a criança vai entender o caráter persuasivo da publicidade. Você está estimulando o consumo excessivo e traz valores materialistas. O que parece muito inocente é prejudicial para as crianças”, afirma a advogada.

O Conselho Federal de Psicologia enviou um parecer ao MP concordando com a opinião do instituto. “O pequeno leitor está literalmente cerceado de mônicas, cebolinhas e cascões, seja para divertir, seja para desejar produtos variados, misturando-se ambos os aspectos da questão. Cabe a pergunta: para que tantas propagandas relacionadas às personagens, uma vez que o objetivo primeiro da revista deveria ser o de divertir e fazer ler”, cita o professor da Universidade de São Paulo (USP) ,Yves de la Taille, que assina o texto.

A assessoria do desenhista e empresário Mauricio de Sousa informou à reportagem que ele prefere, por enquanto, não comentar o caso, que corre no Ministério Público de São Paulo. O desenhista terá de prestar esclarecimentos ao MP, que poderá mandar retirar a publicidade dos gibis.

O Instituto Alana recebe, diariamente, dezenas de denúncias sobre possíveis abusos na publicidade infantil. Isabella cita uma propaganda, retirada do ar recentemente, que mostrava crianças brincando com um botijão de gás. “Há excessos. No Brasil, vende-se até carros para crianças. A publicidade influencia em 80% das compras da família, é uma verdadeira promotora de vendas”, explica a advogada. Ela explica que há vários dispositivos legais que proíbem a propaganda voltada para as crianças. “A lei existe, resta cumprir. É mais fácil vender para uma criança”, completa Isabella.

LEGISLAÇÃO O Instituto Alana defende que, de acordo com a interpretação conjunta da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Código de Defesa do Consumidor (CDC), a legislação brasileira já proíbe propagandas dirigidas às crianças. O artigo 37 do CDC, por exemplo, veta qualquer tipo de publicidade enganosa ou abusiva e repudia a mensagem publicitária que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança. “É abusiva, entre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite a violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeite valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança”, cita o texto.

O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça também está atento às consequências da publicidade na formação e na saúde das crianças. Um dos principais focos de preocupação é a propaganda de alimentos, que causa reflexos no crescimento da obesidade infantil no país. Atualmente, o DPDC e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estudam baixar normas mais rígidas para o setor. O Ministério da Justiça informou que pretende ampliar os estudos para outras áreas.



História
Mauricio de Sousa começou a carreira em 1959. A primeira tira, publicada no jornal Folha da Manhã, mostrava um cachorrinho e o dono dele – depois batizados de Bidu e Franjinha. Em 50 anos de carreira, suas criações saíram dos gibis e chegaram às telas de cinemas e TVs, jogos e internet. Um império que já produziu 1 bilhão de revistas vendidas em 126 países, além de cerca de 3 mil produtos licenciados. Mônica, a mais famosa personagem de Mauricio de Sousa, recebeu o título de embaixadora da Unicef no Brasil.

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