Estado de Minas 15/08/09
Posse de bens duráveis é uma demanda necessária
Carlos Eduardo Stempniewski
Mestre pela Fundação Getulio Vargas (FGV), administrador, consultor e professor universitário
Acautele-se. O momento está muito complicado. Dias atrás o presidente do maior banco brasileiro encantou a todos dizendo que “bancos reduzirão juros mais rápido”. Em seguida, economistas das duas maiores instituições bancárias privadas sentenciaram: “A recessão acabou em maio”. Tanta notícia boa só foi ofuscada pelo levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que mostra que a média nacional de crescimento do setor industrial aponta para uma queda de 13,4% na comparação com o primeiro semestre de 2008. Ter ou manter um bom salário continua difícil. Fique atento com o destino diário do seu dinheiro. Se você consegue poupar entre 5% e 10% do seu salário mensal, parabéns. Caso contrário, não desanime, veja onde focar o controle dos seus gastos. Ninguém sabe quanto tempo esta crise poderá perdurar. Uma coisa é certa, ela já está influindo no seu orçamento doméstico. Atente para as sete principais agressões ao seu escasso dinheiro. A primeira delas diz respeito à renda líquida. Observe quanto é creditado no banco da sua remuneração mensal. Atenção para os descontos: crédito consignado, Imposto de Renda, INSS, vale-transporte, vale-alimentação, vale-farmácia etc. Muitos são os benefícios recebidos e não são poucas as coparticipações descontadas. Dependendo de cada caso, podem ficar retidos até 31% do seu salário bruto. Raciocine sempre sobre o que sobra para os compromissos do mês.
Isoladamente, os valores das despesas domésticas podem ser pequenos, porém, quando você soma água, luz, gás, condomínio, telefone fixo, celular, assinatura de TV a cabo, internet, aluguel, supermercado, sacolão, pequenas manutenções etc., os valores podem se tornar expressivos. Caso você pague aluguel, fique mais atento. Os gastos vão consumir entre 15% e 25% do que você recebeu efetivamente; sendo bem-sucedido na vida, nada melhor do que comprar a sua moradia e aquele carro novo para não mais depender dos amigos ou andar de coletivo. Mostrar para as pessoas o seu progresso financeiro pode tirar o seu sono. Investimentos surgem em terceiro lugar. A posse de bens duráveis é uma demanda necessária. Costumamos raciocinar sobre o valor das prestações e se elas cabem no orçamento. Comumente, nos esquecemos do custo de manutenção, seguros, pequenos reparos e defeitos de fabricação, que levam ao desembolso de quantias inesperadas. Inclui-se aqui a sua educação formal e a de dependentes. O consumo de bens supérfluos pode obrigá-lo a inclinar-se para instituições de ensino com menor qualidade e reconhecimento público, o que vai refletir na sua capacidade futura de melhores salários. Esse conjunto pode comprometer até 30% do seu orçamento.
Sua base de sobrevivência está estabelecida, vamos à luta. O mundo diz que devemos viver a vida, não conhecemos o dia de amanhã, dinheiro não é tudo e por aí vai. O lazer e cuidados pessoais surgem em quarto lugar. Aqui entram as baladas, viagens, cirurgias estéticas, academia de ginástica, salão de beleza, refeições fora de casa, a casa na praia ou no campo, as comemorações de aniversário, casamentos, bodas ou qualquer outro evento. Dependendo do seu padrão de consumo, a conta pode ficar cara, caríssima. Evite desembolsar mais do que 10% da sua renda líquida nesses eventos.
Em quinto lugar, aparece o impulso. Um verdadeiro flagelo para orçamentos frágeis. Muitas vezes, potencializa o supérfluo ou o bem de uso esporádico. Pense bem antes de agir. Não é porque está barato que você vai levar tudo. Veja se você está realmente precisando. Comprar uma TV nova para encostar a outra nem sempre é uma boa decisão. Comprar um computador que vai melhorar sua performance profissional é uma decisão mais racional. Pesquise preço, condições de pagamento e a utilidade da compra. Um bom terno ou um costume de qualidade pode ser fundamental naquela entrevista para mudança de emprego e melhora do seu salário. O seu dinheiro é um bem precioso, trate-o com rigor e critério. Seja rigoroso consigo mesmo, não comprometa mais do que 5% do seu orçamento aqui.
Chegamos às dívidas. Originadas nos cartões de crédito, cheque especial, consignado, cheques pré-datados entre outros. Ative seu estado de atenção. Pare, reflita e desista da compra. As taxas de juros no Brasil ainda são as maiores do mundo. Não tem salário que acompanhe o ritmo de crescimento das dívidas. Pague suas compras passadas. Acabar na Serasa, SPC ou cadastro do Banco Central não é bom para sua vida financeira. Elimine esse câncer de sua vida, fará muito bem para sua saúde física, mental e psicológica.
Agora o modismo. Não se entusiasme com situações que objetivam levá-lo ao centro do consumo, ele vai sempre comprometer o seu orçamento. É aquela viagem à Disney das crianças; o utilitário espaçoso que todo mundo está comprando; as refeições caras e bem acompanhadas de cartas de vinho; a decoração nova da casa; trocar o guarda-roupa na nova estação. Enfim, tudo que é ligado à vaidade, glutonaria, superficialidade e imitação em níveis incompatíveis com o seu orçamento. Cada qual conhece suas realidades, limitações, necessidades e sabe como comportar-se. Desenvolva uma base de reflexão bastante pragmática sobre o consumo neste momento em que vivemos. Evite cair nas armadilhas do consumismo. Vivemos uma crise e esta ainda estará conosco por um bom tempo. Entenda que ganhar honestamente seu dinheiro exige muito trabalho e é demorado. Consumir traz autorrealização, estabelece uma relação de prazer com o ato, melhora a autoestima, reforça a sensação de poder e diferenciação em relação ao seu grupo de referência. Tudo isso é muito bom. Porém, devemos evitar que isso sobrepuje nossa capacidade periódica de geração de riqueza material e comprometa nossa saúde mental, espiritual e moral.
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